Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 21.09.1976

Barra

O mau ladrão 

Quando se resolve montar uma peça (seja infantil ou não), a primeira preocupação séria e óbvia deve ser a escolha de um texto com um mínimo de qualidades. Vejam bem que a preocupação não deve ser a de obter um texto com poucos defeitos e sim a de conseguir uma peça que acrescente alguma coisa. E o que dizer, então, quando vemos uma peça com muitos defeitos? A primeira pergunta é por quê?

Ladrão de Bagdá, de Carlos Nobre, sob qualquer enfoque que seja analisada, é uma peça que não tem porque justificar sua escolha.

Tudo ali é artificial e imposto. Os personagens não têm qualquer credibilidade, o autor não sabe retirar ou colocar os personagens em cena, não existe ação dramática, a peça se desenvolve através de recursos inaceitáveis (um personagem mau (??) luta com seu inimigo, vence-o e deixa-o amarrado no pátio da casa de amigos do derrotado. O que acha o leitor? Será que o herói acabará sendo desamarrado?; ou, então, num momento de desespero, um dos personagens afirma; “Se ao menos Hassan entrasse aqui!”. O que acha o leitor? Acha que seria muita coincidência Hassan entrar exatamente neste instante? Pois ele entra.).

A peça de Carlos Nobre, que já não tem um desenvolvimento que se preze, ainda se dá ao luxo de parar a ação para que um dos personagens ensine as crianças da plateia a cantar; e, para que, depois, as crianças o ajudem a cantar a música aprendida, etc, etc.

Porém, o mais sério nisso tudo é que, apesar do mais profundo desconhecimento de uma linguagem teatral, o autor ainda incorre em equívocos educacionais, ao influenciar as crianças a tal ponto que todas mintam “na defesa do personagem bom”.

O texto de Carlos Nobre é fraco e o espetáculo dirigido por Marco Silvestre mais fraco ainda. Não há ritmo, não há qualquer dinâmica. E o elenco é de uma insegurança total, tropeçando seguidamente no texto e dando a impressão de que em nenhum momento está acreditando na peça (ou, pelo menos, “curtindo-a”).

Numa produção que não tem qualquer preocupação na seleção do texto e na escolha do elenco, causa até certa estranheza o visual cuidado observado no cenário e nos figurinos. De qualquer forma, uma situação como esta serve de ótimo exemplo para que se perceba que não basta cuidar apenas da parte visual quando não há ideias por trás de um projeto. O Ladrão de Bagdá, no Brigitte Blair, apesar de uma preocupação com figurinos e cenários, é um espetáculo que não consegue se sustentar porque o texto, o elenco e a direção passeiam no mais completo vazio.