Crítica publica no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 22.07.1995
Turma de circo arma sua lona até no teatro
Às vésperas de completar 10 anos de carreira, a Intrépida Trupe, fiel a seu estilo itinerante, entra em temporada no Teatro Nelson Rodrigues, sem muito estardalhaço, a não ser o que estão acostumados a fazer no palco – ou melhor ainda, em qualquer lugar que dê para montar sua lona invisível.
Vindo quase em sua totalidade da Escola Nacional de Circo, a trupe traduz perfeitamente o picadeiro para o palco. Seus palhaços malabaristas muito pouco se assemelham aos de “técnica” intuitiva, apresentados nos antigos circos. Porem, sua sensibilidade apurada não permite que cheguem ao pasteurizado dos circos business, que se instalam pelo mundo.
Usando o melhor de cada um, aliado a outros elementos como mudança e o humor rascante, a Intrépida Trupe – mesmo tendo sua trajetória marcada muito mais por suas participações especialíssimas em grandes eventos e espetáculos, do que por ter entrado em temporada regular nos teatros – é um dos poucos grupos que já traz acoplado à encenação um público cativo, que sabe exatamente do que participar.
Porém, dessa vez, ao contrário dos espetáculos anteriores, ARN e ARN2 – onde a plateia se deliciava em ser atacada por macacos brincalhões, que pulavam sobre as cadeiras e sequestravam objetos dos mais participantes, que finalmente eram brindados com uma chuva (verdadeira) de pistolas d’água -, o espetáculo fica mais no palco, sem que com isso o elo de cumplicidade se rompa.
Dividido em 14 quadros, Intrépida Trupe e, Kab-ooo-M!! Começa com os intrépidos despencando do alto para um balé acrobático. Usando pouco a palavra ou os movimentos convencionais dos mímicos, os quadros se interligam muito mais pela plasticidade do que pela coerência natural de se contar uma estória.
Os fãs da dança performática são contemplados com quadros de rara beleza, assinados por Débora Colker. As acrobacias têm a marca da criativa periculosidade da Intrépida Trupe, ficando as cenas de humor griffadas pela irreverência de Mariana Mesquita, a diretora do espetáculo.
Dessas últimas se destacam dois quadros: as caveirinhas mexicanas – que perseguem pela plateia um gorducho leitão, realizando depois no palco um jantar pirotécnico, onde até os anfitriões são incendiados – e o balé dos marinheiros de bigode, que maculamente se beijam, ao de Ninguém Poderá Julgar-me, um hit de Jerry Adriany.
Com cenários clean de fotografias luminosas, criadas por Gringo Cárdia, e iluminação que vai do filete de luz a ribalta histriônica de Jorginho Carvalho, Kab-ooo-M!! é uma explosão de bom gosto, que conquista uma nova plateia e surpreende os fiéis espectadores.
Cotação 3 estrelas (Ótimo)