Inspirada em Molière, a peça de João Batista apresenta um texto fraco, mas a cuidadosa encenação mostra muitos acertos. Foto Murillo Meirelles

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 05.11.1994

 

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A criatividade nos detalhes

Há muito que a obra de Molière vem servindo de fonte inspiradora para novos autores. No entanto, com raríssimas exceções, essas versões conseguem se tornar um produto atraente para a plateia. A Incrível História do Homem que Bebia Xixi, de João Batista, inspirado em Médico à força, do autor francês, não se salva da maldição.

A envolvente trama de enganos proposta por Molière acaba, nesta versão, se perdendo em caricaturas exageradas, que só contribuem para diluir o humor ácido do texto original. Apostando todos os seus trunfos no título irreverente, João Batista prende a atenção do público até o ponto em que a surpresa se revela. Passado o anticlímax, a impressão que se tem é que, mesmo antes do desfecho, falta história para terminar o espetáculo.

Entretanto, se o texto apresenta elementos complicadores, a direção do autor se revela bastante criativa. Utilizando uma linguagem muito próxima à do rádio teatro, com interferências do dramalhão mexicano, João Batista concebe um espetáculo de cores fortes, onde a trilha sonora, também de sua autoria, vem recheada com preciosidades do repertório kitsch.

No palco, ainda que com interpretações desiguais, o elenco procura suprir as lacunas do enredo, revestindo seus personagens com adequado tom farsesco. Roberto Guimarães, destacando-se dos demais, usa a graça dos austeros, com medida exata, para compor o seu Pantaleão.

Com muito efeito, Mauro Leite emprega em seus figurinos recortes alusivos às personagens vestidas – a criada tem, em seus vestidos, louças e frutas, e Angélica, a noiva, esbanja coraçõezinhos e buquês. Os cenários de Dóris Rollemberg oferecem perfeita ambientação à história.

O espetáculo tem ainda grande colaboração na luz artesanal de Renato Machado. As lâmpadas pintadas à mão, penduradas no teto, fecham a caixa-teatral como há muito não se via.

Apesar de uns poucos erros, os acertos fazem de A Incrível História do Homem que Bebia Xixi um espetáculo bem-humorado, que merece ser visto, não só pelo impacto do título.

A Incrível História do Homem que Bebia Xixi está em cartaz no Espaço III do Teatro Villa-Lobos, aos sábados e domingos, às 17h. Os ingressos custam R$ 5.

Cotação: 2 estrelas (Bom)