Isa Vianna (E) e Maurício Grecco, como Marco Polo, na peça de Fátima Valença, que mostra boas atuações do elenco.
Foto de Guga Melgar

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 23.04.1994

 

 

Barra

Em cena, o prazer de representar

Num palco sem cortinas ou coxias que escondam o desmonte das personagens, os cinco atores de A Inacreditável História de Marco Polo e sua Exuberante Viagem ao Oriente já estão em cena quando o público tem acesso à plateia. Com seus quimonos de judoca, devidamente relaxados e preparados, dão início a incrível viagem. Não exatamente a do Marco Polo do título, mas a do ator no ato de representar. Muito mais do que o texto e a história que se conta, A Inacreditável História… é um espetáculo de atores, e estes são inacreditavelmente talentosos.

O texto original de Fátima Valença abusa da palavra para quase narrar a história do viajante italiano. O roteiro, de Dudu Sandroni, embora não suavize o excesso narrativo, tem grande força nas cenas de ação. Num palco quase nu, resguardado ao fundo pelas armações de bambu que sustentam os figurinos, o espetáculo concebido por Sandroni sugere um enorme tatame pronto para receber o primeiro round. Por lá, 30 personagens contam e vivem suas cenas propositadamente

Pausadas e desmontadas aos olhos do espectador. Na luta entre o contar e agir, sai vencedor o segundo.

Marco Polo deixa na Itália a mamma e o nonno, e parte para a China do Grande Khan, onde, ao longo dos 16 anos de sua estadia, tem muitos casos para contar, sendo ele, ou não, o protagonista das aventuras. Se o que se passa é vero, fica por conta do ouvinte avaliar.

No elenco bastante afinado – de acordo com a proposta cênica de Sandroni – , Maurício Grecco representa Marco Polo com irrepreensível toque de humor. Marcos Ácher se divide em sete papéis, com bastante versatilidade. E, no restante do elenco, Carmem Frenzel é o que se poderia chamar de um capítulo a parte. Suas personagens diferenciam-se tanto que parecem representadas por seis atrizes diferentes. Da mamma um tanto irritadiça de Marco Polo ao anjo muito pouco angelical que vem a Terra dar uma força ao povo cristão, é surpreendente a qualidade sua performance. Saindo de seu estilo marcante, de trajes reciclados com muito bom gosto, Ney Madeira cria um figurino com acessórios mais inusitados. No bustiê das odaliscas, o desentupidor de pia dá o efeito sexy. Também de grande efeito, a iluminação de Djalma Amaral cria no telão a passagem do tempo. O minúsculo cometa que se desloca no céu é um delicado registro de que luz não se faz só com spots e refletores.

A Inacreditável História…, apesar do excesso de texto explicativo que interliga os pequenos atos, é um espetáculo bem-cuidado, sem desperdícios gratuitos dos elementos que o compões. Como grande trunfo, esta em cena o prazer de representar.

A Inacreditável História de Marco Polo e sua Exuberante Viagem ao Oriente está em cartaz no Teatro Bertold Brecht, aos sábados e domingos, às 16h30. Ingressos CR$ 2.500.

Cotação: 3 estrelas (Bom)