Crítica publicada no Jornal do Brasil
Por Macksen Luiz – Rio de Janeiro – 08.03.1998

Nuanças se Perdem no Relato Oral

Não deixa de ser uma tentativa exploratória no terreno da linguagem. Histórias de Shakespeare, que está em versão para adultos no Teatro II do CCBB (leia ao lado crítica da versão para crianças), reúne cinco peças shakespearianas, Hamlet, Muito Barulho Por Nada, Romeu e Julieta, A Megera Domada e Macbeth, contadas pelo grupo Morandubetá, que desenvolve a técnica de contar histórias, especialmente para crianças e adolescentes. Histórias de Shakespeare é uma extensão para um público diferente, que poderá ser atingido pelas mesmas características dessa tradição narrativa. O contador de histórias reproduz uma narrativa, estabelecendo através da oralidade uma situação fabular capaz de transmitir aos ouvintes o caráter da obra. É uma maneira até certo ponto mais direta, já que há uma relação permanente entre a palavra e a criação de um universo através da voz de quem interpreta a história.

A riqueza desta forma narrativa está na possibilidade do narrador conseguir criar fabularmente a história com recursos que se restringem praticamente à voz. A maior dificuldade está no aspecto algo redutor que os recursos próprios dessa maneira de contar não conseguem superar, especialmente quando se adapta a uma encenação teatral.

As peças de Shakespeare que foram escolhidas para essa aclimatação à linguagem da narração teatral trazem em si o peso da sua linguagem de origem. São textos teatrais com especificidades dramatúrgicas nem sempre susceptíveis de adaptação à linearidade da narrativa de um contador de histórias. Por mais que o grupo tenha perseguido uma linha que fizesse correspondência com a nova forma expressiva, a tarefa se mostra superior às singularidades de uma história contada.

Por outro lado, o teatro guarda da linguagem que lhe é própria uma dinâmica narrativa que reage com pouca intimidade à estrutura da narração. Das cinco peças de Shakespeare adaptadas pelo Morandubetá resta a ação pura, a sucessão de fatos que compõem a história. Mas não se reproduzem as suas nuanças e a dimensão poética e dramática de cada uma delas. Mesmo mostrando certa habilidade no contraponto narrativo de Romeu e Julieta e de Muito Barulho por Nada, o espetáculo não se acomoda à fluência da história contada.

Os contadores de histórias, Benita Prieto, Celso Sisto, Eliana Yunes e Lúcia Fidalgo, se dividem nas funções de narradores e atores, emprestando pouca expressão a interpretações que se confinam a uma permanente descrição em sequência. O grupo Agrafus faz alguns comentários musicais e alcança nas suas intervenções um clima teatral mais envolvente do que a narração das peças que se sobrepõem à linguagem para a qual não parecem ter encontrado um método satisfatório de transposição.