Crítica publicada no Jornal O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 18.08.1979
Os Bois: uma festa popular
O que vem caracterizando os textos de Sylvia Orthof é a existência de uma linguagem livre e poética em peças que propõem uma posição de abertura do indivíduo perante a vida. Isso fica muito patente nos seus dois textos mais conhecidos do público: A Viagem de um Barquinho e Zé Vagão da Roda Fina e sua Mãe Leopoldina. Sylvia dirige, faz cenários e faz figurinos, além de escrever. Mas, se perguntarmos aos espectadores quem é Sylvia Orthof vão responder certamente que é uma autora, pois é através dos textos que ela é identificada. Em Folia dos Três Bois, entretanto, o texto não vem com o destaque que tinha nas encenações anteriores. Ele é um mero pretexto para a festa musical.
Na realidade, Folia dos Três Bois busca uma aproximação com a cultura popular. Os três bois coloridos (os “reis magos”) acabam chegando à rede (manjedoura) onde nasce o filho dos dois sertanejos que viajaram a peça toda para chegar a Serisecó (Belém). Nesta caminhada natalina, entretanto, o que interessa são os encontros: com o Boi Branco com o Rei, o Chapeuzal, o Navio Pirata, Boi Amarelo, Rainha Passista, Lagarta Lulu (a sedutora), Cangaceiro, Galo, Ema, Vaca, Via Láctea, Céu da Noite de pileque, Lua, Avião Americano, Boi Vermelho, Pé de Manacá, Táxi Carioca, etc.
Na observação dos nomes desse exército de personagens talvez já dê para o público captar um pouco do clima proposto. A proposta do texto é a de levar o casal de sertanejos, a cada encontro, a motivar um momento musical. As músicas baseadas no folclore nordestino, criam, então, o clima de festa popular. Para a plateia – principalmente a infantil – há ainda o que talvez seja o fator fundamental para o envolvimento: as figuras coloridas criadas pela autora e por Gê Orthof. Os bonecos são, na realidade, a grande-força do espetáculo, conjugando, por exemplo, a beleza da Ema e do Rei com toda a sedução da Lagarta.
A direção, da autora, criou um espetáculo alegre, animado, gostoso, colorido; as músicas, bem selecionadas, dão o tom popular; a luz de Aurélio de Simone amplia visualmente o significado de certas cenas; os figurinos (malha acrescida de adereços) funcionam bem; e o elenco, muito seguro, tem a qualidade de fazer diversificadamente inúmeros personagens e de manter o tempo todo o tom de festa. Destaque para João Moita que faz, entre outros papéis, o da Lagarta sedutora.