Crítica publicada no jornal Cidade de Santos
Sem identificação do jornalista – São Paulo – set 1984
Filme triste, uma visão dos anos 60
A ação se passa no inicinho dos anos 60, tempo que Jânio Quadros havia renunciado e Jango assumia como presidente, vinha até o parlamentarismo, e todos ainda tinham nos olhos as imagens dos anos JK. Um grupo de jovens vivem essa época que também é a do laquê nos cabelos penteados em “ninho”, os conjuntos de ban-lon, os vestidos tubinho, movimentavam-se em carrões – Sinca Chambord e o Aero Willis – e iam a festas regadas a cuba-livre e Hi-Fi, dançando ao som de Ray Coniff, Nat Cole, Neil Sedata como Cely Campelo e Trio Esperança. Hora da saudade? Não apenas Filme Triste, a peça de Vladimir Capella, que faz uma revisão dos anos 60, foi montada pelo Grupo Pasárgada e estreia hoje, no Teatro Municipal, para ficar até domingo.
Paulista de 32 anos de idade, teatrólogo e também compositor, além de diretor (responde pela direção desse espetáculo) , Vladimir afirma que “no início dos anos 60 eu tinha poucos anos de vida, era uma criança e via a vida romanticamente, como continuo vendo até agora. Mas era, também, um tempo ruim, politicamente, com a revolução de 64. Hoje, o período em que vivemos é muito parecido com aquele, só que ao contrário… Minha peça é uma história de traição, entre um casal de quarenta anos de idade. Ele Humberto, ela Rosa, ambos da classe média.
A história se passa na primeira metade dos anos 60, entre jovens dessa classe média paulistana, com o cotidiano da turma, os namoros de portão, os bailes, o sexo como discussão mais do que a prática, os cigarros fumados em esconderijos. Nesse grupo estão Humberto e Rosa, ela a romântica estudante de piano, ele o eterno namorado entre encontros, desencontros, reencontros, que chegam até 1964.
Para o crítico Jefferson Del Rios, “o espetáculo realizado por gente muito jovem, pretende contar como era a vida, os usos e costumes das pessoas que hoje, estão na casa dos 40. A visão de Capella, autor e diretor, e companheiro de elenco, é delicada, respeitosa, ainda que vagamente irônica. Eles querem mostrar “juventude, amor, traição, no painel histórico dos conturbados anos 60”. Justamente essa retomada dos usos e costumes, para o crítico um “material fartíssimo, doce, fácil de usar para efeitos reminiscentistas” é também a “parte mais bonita e convincente do espetáculo”.
“Vladimir Capela” continua Jefferson, “curiosamente não tenta recordar nada. É jovem demais ao ponto de ver os anos 60 como algo antiguíssimo. E por este olhar extremamente juvenil sobre o Brasil, dos anos 60, fez um espetáculo que serve par quarentões e adolescentes. Na realidade, certos comportamentos básicos não mudaram. Os namoros escolares, infanto-juvenis continuam nascendo do mesmíssimo jeito tímido; os encantos e seduções se processam com as velhas encenações: presentinhos e elogios desajeitados. Se existe evidente liberalidade de orem sexual, o que é bom, a inovação não anula as ansiedades e deslumbramentos das primeiras paixões. Capella fala disso.”
O espetáculo é do grupo Pasárgada, da Cooperativa Paulista de Teatro, e tem cenários de Carlos Pazetto, figurinos de Valnice Vieira e elenco formado por Dani Patarra, Ju Rodrigues, Marcos Favareto, Valnice Vieira, Suzane Walker e Vera Alice Zimmermaan.
Filme Triste está hoje e amanhã, às 21h00 e domingo às 20h00, no Teatro Municipal, com ingressos a 5.000 e 4.000 estudantes, à venda na bilheteria do Centro de Cultura, avenida Pinheiro Machado, esquina de Francisco Manoel, telefone 32-6500