Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 22.06.1975
Festival de Palhaços: um absurdo.
O início da peça leva o público a pensar num espetáculo leve, gracioso, dinâmico, rico. As cores dos figurinos, os desenhos do cenário, a movimentação segura, alegre e comunicativa dos atores – tudo isso cria uma impressão de muita vitalidade teatral. Mas, aí o espetáculo acaba e se transforma naqueles antigos programas infantis radiofônicos: o que interessa é colocar crianças no palco, fazer uma fila com elas e deixar o tempo passar.
As crianças da plateia resta procurar o que fazer, pois o que acontece não traz o mínimo interesse para elas (aliás, nem para as que sobem ao palco). O que dizer de uma peça (????) que coloca vinte crianças em fila ameaçando-as como essa mágica tão maravilhosa? Segundo a animadora (????), há água dentro de uma jarra, e as crianças poderão pedir o que bem entenderam pois a água se transformará naquilo em que elas desejarem. Começa então a fila interminável e os diálogos cansativos apetitivos.
– O que é que você quer meu bem?
– Limonada – responde a criança. E a animadora dá um gole d’água para a menina.
– Viu, que mágica maravilhosa?
Outro!
As crianças que beberam a água (e participaram, assim, de uma experiência de vida altamente significativa e enriquecedora) vão formar uma outra fila, um tanto ou quanto perturbadas porque não viram mágica nenhuma. (E tudo é tão mal feito que não se pode nem alegar que, no fundo a peça está é estimulando a imaginação infantil!!). Mas, logo as coisas se esclarecem todas as crianças que subirem ao palco receberão revistas de uma determinada editora. Depois, o fato se repetirá as crianças subirão ao palco novamente será catada uma musiquinha (repetida “Ad/Nauseum”, tantas vezes quantas forem as crianças) e em seguida serão distribuídos cofrinhos de uma determinada caderneta de poupança. Ou seja, não há nenhum compromisso com o teatro infantil e sim com a picaretagem infantil. O compromisso é com os patrocinadores. E isso ficou bem claro quando uma menina pediu para que água fosse transformada em Coca-Cola. A animadora (Dilu Melo) discordou imediatamente.
– Não, filhinha. A gente não pode dizer esse nome. A gente não pode fazer propaganda de graça.
E pior é que tudo é feito sem nenhum remorso, sem qualquer arrependimento. E, vendo as crianças se massificarem, pois, perdidas no palco, começaram a repetir – como papagaios – os pedidos já feitos pelas outras, a animadora levantou a voz e declamou vitoriosa.
– Teatro infantil é isso, minha gente. Uma criança pede limonada, as outras todas pedem. Faço isso há 28 anos. Teatro infantil é isso. Basta uma pedir que as outras todas pedem igual!
Não! Picaretagem é isso. E a picaretagem ficou bem definida quando a animadora anunciou sua próxima produção uma remontagem do inacreditável – de tão ruim – Lumu, o Macaquinho Verde. Uma menina na plateia berrou: – Eu já vi!
E a animadora respondeu:
– Ah, que bom, então você já é minha freguesa!
Não foi a toa que ela disse a palavra freguesa?
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