Crítica publicada pelo Jornal da Tarde
Por Clóvis Garcia – São Paulo – 17.10.1982

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Uma história de amor para crianças. Com fantasia e realidade

O Ciclo de Leituras Dramáticas, com as peças selecionadas no seu banco de textos, promovido pela Associação de Teatro para a Infância e Juventude (APTIJ), vem revelando novos autores para o público jovem. Feitiço da Vila, de Zeca Capellini e Claudia Dalla Verde – que já no ano passado haviam sido apresentados no ciclo e encenam Fada Rock… Fada Rock -, é montada agora, no Teatro Galpão, sendo peça selecionada no ciclo deste ano. Assim, o teatro infanto-juvenil vem desenvolvendo uma dramaturgia nacional, numa dimensão maior que o teatro para adultos, pois, das 43 estreias e 10 remontagens de 1982, todas eram nacionais, enquanto os espetáculos para adultos apresentaram 41 estreias com peças nacionais e 24 estrangeiras, fora as remontagens na proporção de 14 para 3.

O texto de Feitiço da Vila se propõe a recuperar o mundo da fantasia, jogando com dois níveis: a realidade, bastante próxima do público, passada numa vila em que três rapazes tentam namorar uma menina, nova moradora, obstados pela expressão agressiva e masculinizada da adolescente; o nível da fantasia, com uma narrativa inspirada, longinquamente, na Bela Adormecida, com uma princesa amaldiçoada no seu batizado, com o impedimento do amor a não ser que o candidato possa vencer três difíceis provas. A passagem do mundo real para o fantástico é feita com habilidade, as histórias apresentando personagens correspondentes e incidentes paralelos.

O tema do primeiro amor é mais indicado para um público adolescente, mas o espetáculo, com direção de Claudia Dalla Verde, tem um apelo à imaginação do público infantil, além de um ritmo permanente que não deixa cair o interesse, um elemento de comicidade nos problemas do mundo real e o fantasioso do conto de fadas, com seus mágicos, dragões, feiticeiras, príncipes e princesa, que atraem a atenção das crianças. Realizada com economia de recursos, a encenação também é  imaginativa utilizando alguns elementos formais que se transformam nos mais diferentes objetos, movidos pelos próprios atores, com figurinos coloridos no mundo da fantasia e realistas na história real, todos criados pela diretora. A música de Vladimir Capella com arranjos de Cássio Piccolo tem a qualidade do autor, mas infelizmente é gravada – eterno problema do teatro infantil – com apenas um momento em que aprece um violão, que poderia ter sido utilizado durante todo o espetáculo. O elenco é bastante dinâmico, bem entrosado, vencendo as barreiras das péssimas condições do Teatro Galpão, sob controle do Inacen, desde a luz que rompe o teto (os espetáculos infantis são diurnos, como todos sabem) até goteiras no palco e na plateia.