Matéria publicada no Jornal do Brasil (2 col x 42 cm)
Por Yan Michalski –  Rio de Janeiro – 1964

Barra

Fantoches no Arena

O Teatro de Arena da Guanabara, agora sob a direção artística de Paulo Afonso Grisolli, inicia no próximo domingo uma nova fase de sua existência, com uma iniciativa ainda bastante rara entre nós: um espetáculo de fantoches, a cargo do dois verdadeiros pioneiros desse gênero teatral no Brasil, os Argentinos Pedro Touron e Ilo Krugli, há alguns anos estabelecidos no Rio. O texto escolhido para a estreia é de autoria de Pedro Touron e intitula-se As Aventuras da Bruxa Trapaceira ou Como a Colher Tirou o Feitiço.

Eis que dois artistas têm a dizer sobre o espetáculo a ser lançado, depois de amanhã no Largo da Carioca:

“O nosso espetáculo já tinha sido apresentado a um grupo de crianças da Escolinha de Arte do Brasil. No primeiro confronto com o público, a peça adquiriu novas características, pois algumas situações que a princípio achávamos secundárias, repercutiram fortemente na sensibilidade das crianças, o que nos levou a remodelar a peça em função dessa reação. O esquema da peça continua o mesmo, porém os detalhes da apresentação foram trabalhados no sentido que nos foi sugerido pelo público infantil.”

“Aliás, uma peça para fantoches é um organismo continuo, pois oferece uma grande margem à improvisação. Uma peça pode transformar-se consideravelmente na hora da apresentação seja para atender a vontade das crianças, seja devido a contribuição do ator que, identifica com o personagem e com a situação, num impulso de criação recorre meios que não estavam previstos no texto, para conduzir uma cena de uma maneira diferente e inesperada. ”

“Na expressão dramática do teatro para fantoches, tal como o concebemos tudo o que é realizado para atingir a sensibilidade de crianças nos parece válido; a peça deve refletir, como um espelho, os interesses que levaram as crianças ao teatro. O escritor e o ator efetuam uma viagem de volta até as suas próprias experiências infantis, mas com o olhar alerta de um adulto. Tudo aquilo que o sentimento da criança desconheça, e tudo aquilo que possa constituir um obstáculo á vontade da criança, é considerado terreno proibido. Quando o pano abre, o escritor e o ator estão recriando um sonho coletivo; e cada criança na plateia está sozinha, olhando para sua própria alma.”

“O nosso espetáculo se desenvolve num clima constante de magia e absurdo e tenta apresentar um confronto bem nítido entre os valores elementares; o choque contínuo do bem contra o mal. Desta luta surge a vitalidade característica do teatro de fantoches.”

“As crianças reagem de maneira bem diferentes diante do ator vivo e diante do boneco. As razões são várias; por exemplo, a presença da figurinha de papelão e de pano oferece á criança uma oportunidade maior de identificação sem expô-la a comprometer-se diante do adulto, fugindo da censura do adulto. Por outro lado, os aspectos simples e simbólicos desse jogo de imaginação e provocação dão um sentido de objetividade ao encontro da criança com o fantoche, o que chega, aliás, a ser utilizado, extremamente, por psicólogos e educadores, para facilitar a comunicação e a expressão de conflitos que dominam a criança, através de figuras-símbolos tais como, Pai, Mãe, Bruxa, Rainha etc. Num espetáculo de fantoches, tudo acontece intensamente, mas com simplicidade; até a morte. Com a mesma intensidade e com a mesma simplicidade com a qual se quebra um boneco para ver depois o que ele tem dentro.”

“Se desejos podem ser chamados planos está dentro dos nossos planos, também, a realização de espetáculos de fantoches para adultos. “O adulto poderá encontrar muita coisa no ministério do fantoche, e se souber olhar para dentro do boneco que se movimenta no palco, poderá descobrir e alcançar aquilo que é tão necessário para a sua sobrevivência espiritual: o símbolo e a poesia.”

Aventuras da Bruxa Trapaceira ou Como a Colher Tirou o Feitiço será levado no Teatro Arena da Guanabara, no Largo da Carioca, as sextas-feiras, ás 16hh30 e aos domingos, e aos domingos, ás 10h30 e 15 horas. Esta semana, não haverá espetáculo sexta-feira, estando a estreia marcada para o domingo.