Sônia Praça(C) dá vida à namoradeira Maricota.
Foto Murilo Meirelles

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 01.09.1996

 

Barra

Um divertido Martins Pena

A Companhia Dramática de Comédia, em seu terceiro espetáculo dedicado ao público infantil – os dois primeiros foram A Incrível História do Homem que Bebia Xixi (Médico à Força, de Molière) e Volpone, de Ben Jonson – traz ao palco mais uma vez uma sua versão da comédia clássica, alvo de suas pesquisas, e desta vez acerta em cheio na tradução.

Esconde-Esconde é o nome que deram a Judas em Sábado de Aleluia, de Martins Pena, autor considerado o “pai da comédia brasileira”. Martins Pena, que segundo seus biógrafos, mesmo tendo sofrido influências de outros comediógrafos como Molière, Holdeberg e Goldoni, carece em sua obra da finura dos dramaturgos de boa sociedade, é também acusado por eles de escrever suas peças para uma plateia pouco culta, acostumada a assistir farsas mais ou menos grosseiras. O certo é que , mesmo sofrendo críticas ferozes, o autor revela em sua obra o reflexo fiel da vida carioca em meados do século passado – Judas … é de 1840. Suas peças, encenadas nas mais diversas versões, são hoje importantes fontes de informação para os estudiosos dos costumes da época.

O texto, com os ingredientes de uma comédia de costumes, mesmo que não deixe claro para a plateia infantil todas as suas intenções, conquista o público pela trama de surpresas. Num sábado de Aleluia, o Sr. Pimenta tem em sua sala um Judas pronto para ser queimado. No mesmo ambiente, a namoradeira Maricota conta para a tímida Chiquinha sobre os seus muitos pretendentes. Um é o soldado Faustino e o outro, o capitão Ambrósio, seu superior que, por conta do namoro com Maricota, vive a lhe perseguir. Exatamente na hora em que Faustino e Maricota estão namorando na sala, Ambrósio bate à porta. A moça se esconde no quarto, e, sem que ela saiba, o soldado veste a roupa do Judas, e passa a assistir de camarote todas as traições e falcatruas na casa do Sr. Pimenta. Na trama de equívocos, o autor, com muita habilidade, realiza o sonho da maioria dos mortais: ver sem ser visto.

A direção de João Batista, em total colaboração com sua equipe técnica, realiza um espetáculo bem encadeado, onde os elementos convivem harmonicamente. Os cenários de Doris Rollemberg cobrem a arena do Teatro do Planetário com uma espécie de planta baixa alegórica, que divide o chão do palco em diversos ambientes. Num colorido preciso, estão recortados, sala, cozinha, varanda e quintal, em detalhes que situam a ação. Nos figurinos, Mauro Leite grafa a época usando as cores da Companhia como uma marca. A iluminação de Renato Machado, com adereços de luz, deixa o ambiente aconchegante.

Com o elenco mais afiado do que nunca com a proposta da direção, Roberto Guimarães, Sônia Praça e Eduardo RIeche, pertencentes ao núcleo mais estável da Cia., repetem as excelentes performances dos espetáculos anteriores. Rieche, no entanto, não apenas pela força do personagem: o soldado Faustino ganha a gargalhada da plateia pelo gestual de humor bem construído.

Esconde-Esconde é um espetáculo cheio de ação, que tem todos os méritos de levar a cena um cultuado autor brasileiro, desconhecido do seu público-alvo, em divertida encenação.

Cotação: 3 estrelas (Ótimo)