Nós nos Nós: linguagem ‘clown’ e técnica favorecem atores


Crítica publicada no Jornal do Brasil
por Carlos Augusto Nazareth – Rio de Janeiro – 15.05.2004

 

 

 

 

 

 

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Narrativas por um fio

Escola de Anjos se ressente de linguagem didática

Escola  de Anjos espetáculo da Cia. Nós nos Nós – Tragédias e Comédias Aéreas, em cartaz no Teatro Ziembinsky, conta a história de cinco crianças que simbolizam, cada uma, os atributos medo, preguiça, vaidade, egoísmo e a violência. Numa escola situada entre o céu e a terra,  esses meninos e meninas, penduradas por tecidos, tentam aprender a ser anjos. Para ganhar asas, devem superar seus defeitos. Mas acabam retornando à terra na figura um menino, que reúne todas as suas características negativas.

Os integrantes da Cia. têm técnica apurada. Fazem acrobacias em tecidos – alguns usados como corda marinha, na horizontal, outros como corda indiana, na vertical -, lira e trapézio, e assim vão tecendo o desenho cênico. O espetáculo dos tecidos, onde os atores se exercitam, embora atraente, torna-se às vezes cansativo pela sua própria limitação: os atores estão sempre na boca de cena, numa linha frontal. Muitas vezes a cena fica visualmente confusa, pelo excesso de aparelhos. Mas eles são, com certeza, a grande atração do espetáculo.

Com letras simples e claras, a trilha é elemento essencial

A Cia. marca um tento ao conseguir fazer das acrobacias um elemento constituinte da narrativa, e não uma atração à parte, o que é mais usual. O uso da linguagem do clown ajuda a evitar o risco do caricato quando atores adultos interpretam crianças. O elenco se desincumbe a contento de sua função, em especial Camila Magalhães, que interpreta a “violência” e provoca risadas gostosas na plateia.

O espetáculo falha, entretanto, no objetivo de desenvolver a premissa do texto de Gamba Jr., o retorno à terra das crianças que representam algumas das qualidades “negativas” do ser humano. Também não fica claro o conflito central do texto, que se perde em meio às histórias de cada uma das crianças, contando suas experiências, descobrindo-se e revelando-se.

Desta forma o espetáculo mantém-se como as crianças: suspenso por um fio muito tênue, que são as narrativas individuais. A ação dramática, essencial ao texto teatral, dá lugar a narrações descritivas. O espetáculo tangencia perigosamente o didático. É uma escola, há um professor, mas a forma de contar a história, ao tocar a fronteira do ensinamento, retorna a um passado longínquo do teatro infantil, que começou a existir para ensinar. E,  sob a perspectiva da obra de arte, este caminho se afasta da busca de se fazer teatro puro para criança, que provoque e não que ensine.

O cenário de Cláudio Bittencourt e os figurinos de Marcelo Marques lutam contra a falta de recursos de produção. Os figurinos superam melhor esta dificuldade evidente.

A luz, de João Franco, não tem a precisão necessária, principalmente para um espetáculo desta natureza. Os poucos efeitos não conseguem dar às cenas a magia que exigem.

As músicas, de Paula Leal, ajudam a contar a história. Com letras simples e claras, ritmos diversos, a trilha se torna elemento essencial dentro do espetáculo e cria momentos de descontração com  belas melodias.

A direção, também de Gamba Jr., limita-se aos acertos acrobáticos. A escolha de uma linguagem dita “infantil” coloca o espetáculo sob o risco de parecer ultrapassado conceitualmente.

Mesmo assim, Escola de Anjos apresenta um caminho interessante na busca de integração da acrobacia aérea e teatro. Embora os aparelhos com tecido estejam sendo por demais utilizados, a Cia. Nós nos Nós consegue integrar acrobacias, texto e personagens de maneira bastante satisfatória.