Matéria publicada no Jornal do Brasil
Por Luiz Antonio Aguiar (*) – Rio de Janeiro – 25.01.2003
Ensaio Sobre a Leitura – Reflexão sobre o tema em hora certa
Pensar a Leitura: Complexidade
Org. Eliana Yunes, PUC/Loyola, 178 páginas, R$ 12,80
Entre 1992 e 1996, um grupo de educadores funda a Casa da Leitura e deflagra o Proler (Programa Nacional de Incentivo à Leitura). O grupo é inspirado em um conjunto de propostas ousadas, como situar o contato entre o sujeito e a linguagem não apenas na escola, mas no tecido social e comunitário; o trabalho de multiplicação de agentes de leitura, e de acervos, bibliotecas, e de disseminação de práticas leitoras inovadoras, fosse na Baixada Fluminense, no Vale do Jequitinhonha ou nos seringais amazônicos do Acre. A generosa abertura para múltiplas linguagens, nas apenas a escrita/impressa, mas a da oralidade, da memória, e os contadores de histórias; a Incessante busca de reavaliação das experiências acumuladas e de formulação teórica consistente com estas experiências, e a ênfase no caráter libertador da linguagem, em especial da literatura.
Sob essas premissas, verdadeiras expedições eram ejetadas dos grandes centros, do Rio principalmente, cada vez mais ávidas de buscar territórios novos e mais carentes deste tipo de referência, para a implantação do Programa. Quase 600 municípios foram abrangidos.
São as reflexões deste grupo, e da sua prática no Proler, o conteúdo de Pensar a Leitura: Complexidade, matéria oportuna, no momento em que o programa, com a nova orientação de governo e, particularmente, da Biblioteca Nacional, será reavaliado. Para quem não teve contato com a prática, ou com ideias da primeira fase do Proler, pode parecer estranho, à primeira vista, que ensaios que resgatam a importância de um personagem familiar, um avô contador de histórias, estejam no mesmo conjunto de uma reflexão refinada sobre a instabilidade contemporânea do que ainda podemos chamar de conhecimento. No entanto, o que ocorre, num e noutro, como nos demais ensaios incluídos neste volume, é esta busca dos meios de se colocar o sujeito no centro do processo. De valorizar sua contribuição, subjetividade. Trata-se aqui de uma proposta de construção do leitor. Em nenhum momento se desdenha a necessidade do reconhecimento do alfabeto, da formação de palavras, frases, do domínio de normas gramaticais. O que se coloca é que tanto a linguagem só passa ao indivíduo quando ganha vida, quanto que, indissociável da decodificação dos sinais, é a atribuição de sentido.
A exclusão pela privação da leitura pode ser o pesadelo de populações inteiras do mundo. Quanto mais num momento em que outra linguagem ainda mais abstrata e sintética, a da informática vigora em vários eixos da atividade humana.
Neste enfoque, o contrário do excluído é o leitor. Aquele que se torna capaz de transitar de uma linguagem para outra tendo sempre consigo a dignidade, o brio adquirido, o sentido, esse entender-se no mundo. A complexidade embutida nesta reflexão sobre a leitura não é daquelas (complexidades), que, por seu hermetismo, veda o acesso à maioria, mas a que se propaga, buscando, na diversidade de aspectos, abranger e incluir.
(*) Escritor e tradutor