Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 20.09.1980

Barra

E o beija-flor virou decepção

E o Beija-flor Virou Lenda, e Eugênio Santos (texto/direção/cenário), em cartaz no Sesc da Tijuca, é um espetáculo que se frustra. O texto contém uma proposta difícil e acaba se tornando confuso; a direção é totalmente omissa, parecendo ter faltado, ao diretor, uma concepção geral da montagem; o cenário carrega uma excelente ideia (o cenário saindo do próprio chão) mais isso não é explorado; o palco fica vazio a maior parte do tempo e o diretor não consegue movimentar bem seus atores (é incrível como Eugênio Santos, premiado como melhor diretor por Cantares em Desafino (Prêmio Mambembe) tenha realizado um trabalho tão desastroso como esse.); os figurinos de Aroldo Macedo e Juliano D’Assumpção não têm unidade, coerência nem beleza; e o elenco, muito fraco, não consegue “segurar a peteca”, salvando-se Dila Guerra (a menina). A atriz mais experiente do elenco, Priscila Camargo, que fez uma substituição às pressas, a poucos dias da estreia, não é explorada e tem seu potencial guardado para um próximo espetáculo (!). Na parte da criação, o único que acerta em cheio é Paulinho Guimarães, com suas bonitas músicas, destacando-se “Vi nascer um urubu” e a canção final do Beija-flor. Entretanto, o acerto está apenas na criação, já que a execução das músicas é de péssima qualidade: os atores que solam não sabem cantar e o conjunto musical (que toca bem) colocado no meio da plateia, impede que se entendam as letras.

No dia em que assisti à peça, o espetáculo começou com meia hora de atraso, porque não apareceu o iluminador. O diretor explicou o problema à plateia e disse que, então, ele mesmo faria a operação de luz, desta forma, não sairia tão bem. Esse problema inesperado deve ter contribuído para que o ritmo do espetáculo fosse perturbado e para que todas as falhas apontadas se tornassem mais evidentes. Entretanto, por melhor que seja a luz criada por Aurélio di Simoni, ela nunca impedirá que tais problemas saltem aos olhos. É muito possível, apenas, que o visual do espetáculo (nada atraente) se torne mais agradável.

O texto procura passar para as crianças, através de uma tentativa de linguagem poética, a dificuldade de um povo explorado em sair do domínio do mais forte. E mostra, também, o que acontece com os que tentam reagir: são mortos e se transformam em beija-flor. O problema é que a linguagem poética torna-se às vezes, metafórica demais: e, sendo metafórica, o espetáculo  acaba passando para a plateia infantil eu é inútil qualquer tentativa de transformação de uma situação adversa, já que a repressão é mais forte e que tudo acaba frustrando. Esse é um tema muito difícil de ser trabalhado com uma plateia infantil e o texto acaba sendo demagógico, panfletário e maniqueísta.

Como observação final: é absolutamente ridícula aquela mulher fofoqueira feita em travesti. A direção usa a comicidade apelativa, fácil e gratuita e que, apesar disso tudo, nem alcança seu objetivo: no dia em que vi, as crianças não acharam a menor graça.