As narrativas para as crianças estão cada vez mais poéticas. Pelo grupo Sobrevento, por exemplo, a atriz Sandra Vargas (acima) faz peças infantis dedicadas à primeira infância. Foto: Marco Aurélio Olimpio

Matéria publicada no Site da Revista Crescer
Por Andressa Basilio – São Paulo – 23.04.2014

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Crítico de teatro infantil, Dib Carneiro Neto lança livro sobre os avanços do teatro infantil brasileiro

Em entrevista à Crescer, o crítico e dramaturgo conta mais sobre Já Somos Grandes

Que o teatro infantil brasileiro está evoluindo, você já deve ter percebido. Especialmente se costuma acompanhar as colunas do crítico e dramaturgo Dib Carneiro Neto, às sextas-feiras aqui no site da Crescer. As peças voltadas para as crianças trazem cada vez menos a intenção de educar e mais a proposta de estimular a reflexão desde cedo. Para contar sobre essa evolução e acrescentar ainda mais peso nas discussões sobre o tema, Dib está lançando o livro Já Somos Grandes – Teatro Infantil: Entrevistas, Críticas, Debates, Balanços & Rumos (Giostri Editora, R$ 35).

Quem quiser bater um papo com o autor de perto e, de quebra, pegar um exemplar autografado, poderá conferir nesta quarta-feira (23) o lançamento oficial do livro, que acontece em São Paulo, na Livraria da Vila (Alameda Lorena, nº 1731, Jardins), às 18h30.

Em entrevista à Crescer, o crítico contou um pouco mais sobre as percepções que adquiriu no processo de produção da sua nova obra. Confira!

Crescer: De onde veio esse título provocativo, “Já somos grandes”?

Dib Carneiro Neto: Eu estava em uma dessas festas do Prêmio FEMSA de Teatro Infantil e Jovem fazendo entrevistas com os premiados. Um deles me disse: “Teatro infantil é só no nome, nós já somos grandes!” Usei o Já Somos Grandes como título da reportagem que publiquei no Caderno 2 do Estadão, naquela ocasião. E agora achei que seria a frase perfeita para definir o atual estágio do teatro para crianças feito em São Paulo, que avançou muito em qualidade, em talento, em consistência.

Crescer: Você pode contar um pouco sobre o que buscou contar ao reunir os debates, balanços e entrevistas sobre o tema? Para qual público seu livro se destina?

Dib Carneiro Neto: Gostaria que o livro fosse útil para toda a classe teatral, para pais interessados em compreender esse universo para escolher melhor em que peça levar seus filhos e que interesse também a professores, pois há uma lacuna muito grande nesse segmento educativo, em que professores muitas vezes não estão preparados para conversar sobre uma peça com seus alunos em sala de aula. O livro dá uma pincelada em critérios de qualidade e em parâmetros de comparação, para que o olhar sobre esse teatro voltado para os pequeninos seja ampliado pelos adultos que lidam com a formação dessas crianças.

Crescer: Você escreveu muito sobre a evolução da linguagem, de narrativas, iluminação e até trilha sonora. Um dos pontos que me chamaram atenção é quando você diz que hoje não se faz teatro infantil brasileiro como aula, e sim como arte. Essa foi a principal mudança da categoria nos últimos anos? Você acha que os artistas estão se especializando mais ou o público é que está ficando mais exigente?

Dib Carneiro Neto: Tudo isso junto e misturado. Felizmente fazem-se menos peças infantis hoje para ensinar boas maneiras, para ensinar a escovar os dentes, para homenagear o dia do índio, do folclore… Há maior rigor nas escolhas temáticas, separando arte de educação. Aula é na escola, arte é no palco, arte como metáfora, como sugestão, como simbologias, e não com lições de morais explícitas e chatas. Com tanto bombardeamento de informações por todos os lados e com tantos recursos tecnológicos à sua disposição, a criança também mudou, claro, e tem mais instrumentos para avaliar se uma peça é boa ou se é apenas um lance caça-níqueis dos produtores mal preparados.

Crescer: É possível elencar as principais características do teatro infantil brasileiro? Como ele se diferencia do que é feito pelo mundo? O que ainda precisamos mudar?

Dib Carneiro Neto: Avançamos muito com relação à qualidade estética, capricho visual, rigor dramatúrgico, escolhas temáticas. Há pouco tempo não se fazia uma peça sobre a morte para crianças, ainda que todos os contos de fadas tratem disso. Edulcoravam o lado cruel dos contos de fada. Hoje, há mais consciência da importância que é falar de todos os temas com compromisso, com responsabilidade, mas como arte, com as delicadezas e sutilezas da arte. E os encenadores brasileiros são imbatíveis em alegria, em colorido visual, em trilhas sonoras contagiantes, em levantar o astral da plateia!

Crescer: Houve um aumento de peças com histórias muito poéticas e profundas. O grupo Sobrevento, por exemplo, volta sua arte toda para a primeira infância. Diante disso fico me perguntando se as crianças conseguem entender, e mais, se entreter, com essas abordagens diferenciadas. Elas me parecem tão adultas. O que você acha?

Dib Carneiro Neto: O melhor espetáculo é o que embute em si todos esses sérios compromissos com linguagens e poéticas e dramaturgias, mas ao mesmo tempo não perde a condição de arte e entretenimento. A criança não precisa sair da peça sabendo fazer uma análise profunda do que viu, mas precisa fruir o espetáculo de forma interessada do começo ao fim, e, para isso, não se pode abrir mão de talento, pois criança é cruel e rejeita diretamente o que não gosta, sem subterfúgios, sem papas na língua.

Crescer: Como você acha que esse novo contexto sócio-cultural das crianças de hoje, com tecnologia e mais informação, afeta o teatro infantil como um todo?

Dib Carneiro Neto: Na medida em que a criança tem hoje muita informação, chegando a ela das mais variadas e facilitadas formas tecnológicas e midiáticas, isso a faz ser uma criança com mais parâmetros de comparação, aumentando seu nível de exigência. Isso é muito bom para deixar os encenadores em estado de alerta constante com relação ao que estão propondo no palco. Outro fator, menos positivo, é que as crianças de hoje têm menos paciência com o tempo de uma forma geral, porque tudo é muito imediato no mundo das redes sociais e downloads. É preciso saber lidar com o tempo de um jeito diferente de como os artistas lidavam em décadas anteriores, para não se correr o risco de afastar o público de hoje das plateias de teatro. Não digo que não se possa mais fazer peças de longa duração. Teatro muitas vezes tem e deve ter o timing moroso da poesia, do lirismo, mas o que digo é que isso precisa ser feito de forma bem mais esperta e atenta hoje em dia, pois a plateia já chega muito pilhada ao teatro