Todos os anos, desde 2001, comemoramos o dia 20 de Março como o Dia Mundial do Teatro para a Infância e Juventude, criado pela ASSITEJ. Depois de mais de três anos de lutas, em 2008, o CBTIJ conseguiu junto ao Congresso Nacional oficializar, através da Lei 10.722, o Dia Nacional do Teatro para a Infância e Juventude.
Tradicionalmente, o CBTIJ solicita a um artista para criar um cartaz em comemoração à data. Neste ano, a criação foi de Leandro Selister, um artista multimídia de espírito inquieto. Bacharel em Fotografia pela UFRGS, Selister reside em Porto Alegre e segue explorando novos suportes para sua obra. @lselister
Mensagem de Sue Giles, Presidenta da ASSITEJ Internacional
Leve uma criança ao teatro OU leve o teatro à criança!
Em 20 de março de 2023, reconhecemos as/os artistas de teatro e as artes cênicas para crianças e jovens como trabalhadores essenciais; fazendo a diferença na vida das crianças onde quer que estejam e com um conhecimento profundo e especializado do seu público. O teatro e as artes cênicas para crianças e jovens é distinto na sua abordagem; valorizando crianças e jovens como públicos exigentes, que participam e contribuem para a cultura, com direito a experimentar as artes e a ter liberdade de expressão. Dar espaço, lugar e respeito à imaginação de crianças e jovens lhes oferece alicerces sobre os quais construir resiliência e confiança.
Um dos principais objetivos da ASSITEJ Internacional é unificar os profissionais em todo o mundo e fortalecer as possibilidades para o público infantil e jovem em todo o mundo de experimentar o que o teatro e as artes cênicas oferecem – a expressão da emoção, a ilustração do intangível, a interpretação de um mundo complexo. Para fazermos isso, precisamos estar abertas/os a toda a diversidade da criação artística que a nossa rede global oferece e celebrar a inovação oriunda de limitações, desafios e contextos específicos.
Por vezes não podemos levar crianças para os edifícios teatrais. Por vezes, tais lugares não existem. Por vezes, as barreiras físicas, econômicas, geográficas ou sociais tornam isso impossível. Contudo, cada vez que a nossa comunidade global se reúne para discutir ou partilhar, seja online ou pessoalmente, nos tornamos mais conscientes da variedade de formas como os artistas e criadoras/es tornam o teatro e as artes cênicas acessíveis para o público infantil e jovem nos seus contextos. Como é maravilhoso ouvir e ver tantos exemplos em todo o mundo de teatro e as artes cênicas indo até onde as crianças e os jovens estão: nas suas escolas, creches e jardins de infância, nas ruas, nos espaços comunitários, nos hospitais, nos espaços esportivos, nas prisões, nas suas casas, nos espaços públicos, nos seus computadores ou telefones ou rádios.
Devido à nossa conexão global online e nas nossas reuniões, vimos e ouvimos histórias extraordinárias de luta, coragem e determinação e reconhecemos todas as diferentes formas que a nossa comunidade criativa utiliza para chegar mais longe, para satisfazer a necessidade e para criar maior acesso.
O teatro e as artes cênicas fazem a diferença; o contato humano a humano, a propagação de ideias, a partilha de esperança, a explosão de alegria. Não importa se num edifício teatral ou numa rua sem saída, a criação de maravilhas ou um momento partilhado ou um ritual intrigante é algo que pode transformar um dia, ou uma vida, mesmo momentaneamente. É através do teatro e das artes cênicas que reconhecemos o terreno comum entre nós e que o horizonte se torna mais amplo.
Neste Dia Mundial do Teatro e das Artes Cênicas para a Infância e Juventude convoco todas/os nós que trabalhamos neste setor a procurar crianças e jovens que ainda não conhecemos e que ainda não encontramos. O acesso ao teatro e às artes cênicas nem sempre é partilhado ou possível e por isso cabe a nós, especialistas na nossa área, torná-lo possível, onde e como nós pudermos. Somos necessárias/os, em todos os nossos contextos, em todas as nossas práticas diversas, para construirmos pontes entre a realidade e a imaginação e permitir que essa possibilidade floresça para todas as crianças e jovens, em todos os lugares.
Mensagens de crianças ucranianas e iranianas
Após a pandemia, tudo parece estar voltando ao normal. Contudo, há ainda muitas pessoas, especialmente crianças, que continuam sofrendo devido a situações difíceis em todo o mundo, tais como guerras e turbulência social. É importante que prestemos atenção às suas vozes e reconheçamos o quanto elas amam e anseiam pelo teatro e as artes, apesar das suas circunstâncias desafiadoras.
Aqui estão algumas mensagens de crianças da Ucrânia e do Irã.
Duas crianças ucranianas são de Chernihiv, mas uma delas está atualmente na Polônia.
A menina iraniana é identificada por um pseudônimo devido a questões de segurança.
Faina Shyrokorad (Chernihiv, Ucrânia, 9 anos)
O teatro foi sempre uma parte da minha vida. A minha mãe é atriz. Antes de fevereiro (24 de fevereiro de 2022, data de início da invasão russa) ela trabalhava no teatro em Chernihiv. Cresci no teatro e lá passei muito tempo desde que era bebê. Também ia frequentemente assistir a diferentes espetáculos em outros teatros.
Na verdade, o teatro é a minha infância cheia de belos e brilhantes figurinos, cenários, e muitas histórias interessantes. Até tive um pequeno papel em um espetáculo juntamente com a minha mãe.
Também frequentei aulas de teatro em Chernihiv durante alguns anos antes da guerra. Estávamos preparando a nossa primeira peça – o conto de fadas Old Mother Frost (A Senhora Holle). Eu tinha um papel de destaque. Ia interpretar a enteada. Entretanto, não conseguimos completar o nosso trabalho com o começo da guerra.
Gosto muito de teatro, pois posso entrar num conto de fadas na vida real. Sou atriz quando vou a uma aula de teatro. Posso ser qualquer pessoa! Uma personagem de um conto de fadas, por exemplo.
Acho que o teatro é importante. Quando se está no teatro, você tanto pode rir como chorar. Uma peça às vezes nos deixa tristes. Por vezes os espetáculos nos fazem pensar em coisas importantes e podemos tornar os nossos sonhos realidade com o teatro.
Mariia Drozdova (Chernihiv, Ucrânia, 11 anos)
Eu gosto muito de teatro. Gosto tanto de assistir a espetáculos como de me apresentar. Gosto de como as pessoas podem se transformar em personagens diferentes usando emoções, gestos, expressões faciais e atuação.
Fiz aulas de teatro na minha cidade natal, Chernihiv, durante vários anos antes da guerra. Juntamente com outras crianças, não só atuamos como também fizemos adereços e criamos a cenografia. Então, basicamente criamos tudo sozinhos. Fizemos muitas apresentações no passado. Eu tinha papéis diferentes. Na peça “O Pássaro Azul”, atuei com o meu irmão mais velho. Foi muito divertido!
Eu deveria ter dois papéis absolutamente diferentes (Dragão e Ladrão) num novo espetáculo que estávamos preparando. Era O Conto do Cavaleiro que não Tinha o Cavalo. Eu estava tão entusiasmada! Infelizmente, não tivemos oportunidade de apresentá-lo quando a guerra começou. Agora não temos as nossas reuniões semanais na aula de teatro. Sinto muita falta destas aulas.
O que eu mais gosto sobre o teatro é a transformação. Os atores podem usar a sua voz, movimentos e tornar-se outra pessoa. Gosto muito de ser atriz. Adoro atuar num novo espetáculo pela primeira vez. Adoro escolher ou fazer figurinos. Acredito que o teatro é uma questão vital hoje em dia. Significa que outra realidade é criada e que as pessoas estão dentro desta realidade. Às vezes isso pode relaxá-las. Embora mais frequentemente o teatro faça as pessoas pensar em problemas importantes da vida.
Nika Rousta (Teerã, Irã, 14 anos)
Como adolescente que vive nesta situação no Irã, a vida não é muito divertida sem teatro. O nosso país encontra-se numa situação especial, e embora tenhamos apenas entre 12-19 anos, espera-se que nos comportemos como adultos, e quando fazemos isso, os adultos nos silenciam e dizem que ainda somos muito jovens para este tipo de coisas.
Mesmo que os adultos possam nos chamar de mal educados, se algo não estiver correndo bem, nós vamos mudar isso, exatamente como o que está acontecendo neste momento no Irã. Estamos lutando pela nossa liberdade e, ao mesmo tempo, tentando ser um bom irmão, filho, amigo e pessoa. E se temos algo para assistir, como um teatro que nos faz sentir amados, compreendidos e valorizados, é isso o que nos faz continuar.
Como adolescentes, filmes e teatros que nos fazem sentir compreendidos são um bom remédio e uma boa forma de fugir da realidade.
Embora os teatros estejam fechados neste momento, assistir a peças mais antigas na internet é realmente divertido e acho que o teatro é um lado importante da arte e uma ótima forma de representar os sentimentos.
Sinto falta de verdade do tempo em que ia ao teatro com a minha família e amigos. Espero que tudo melhore e volte a ser normal. Compreendo porque os artistas não estão atuando hoje em dia.
Esperamos que os criadores de teatro que trabalham para adolescentes compreendam que não somos nem adultos nem crianças. Lutamos pelos nossos direitos, estamos todos passando por muitos problemas. Apenas nos compreendam e nos amem.
Tradução das mensagens: Cleiton Echeveste (CBTIJ/ASSITEJ Brasil)