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Peço que me dispensem de estabelecer paralelos entre teatro & TV — por uma simples questão de objetividade. Teatro já é um “gênero”: já dispõe de uma gramática, de uma literatura, de um repertório ou código estético bem formulado. TV ainda é um serviço — diz Umberto Eco — que comporta muitos gêneros, inclusive o teatro.

Assim, os paralelos e comparações poderão sofrer de uma carência de definição prévia de “significados” — mais por “culpa” da TV.

O meio-TV é muito complexo e carregado de cargas contraditórias ou contrapostas — por ser um meio-síntese de vários outros meios, e uma resultante dinâmica de um sem número de informações, áudio visuais. Está longe de ser um produto acabado, ou que permita categorizações para fins de uma análise sistemática. As aproximações teóricas sobre televisão, devem ser especialmente cautelosas: animadas pela intuição do pesquisador, mas resguardadas pelo seu bom-senso, calçadas na realidade dinâmica do meio e na sua inter-relação psico-sócio-antropológico-cultural.

Estas exposições, portanto, será necessariamente assistemática — pois relato apenas tópicos do assunto “TV-criança” — os quais, julgo, possam ser férteis para o debate sobre “teatro-criança”. Penso, com isso, poder trazer à nossa área comum (criança & comunicação) algumas informações que possam nos alimentar dúvidas (mais sábias que as certezas…).

Por que assistemática?

1°) São tópicos de uma pesquisa (*) que não chegou a seu término — e que explorou uma área tão extensa quanto variada (as pesquisas sobre TV em geral ainda engatinham).

2°) O Projeto Lobato, por isso, só poderia ter sido um estudo do tipo exploratório, que garantisse a “alimentação” de uma linha básica de pesquisa em TVE, no que toca à questão de programação infantil.

O que tento fazer aqui representa pre­cisamente a função do Projeto — suscitar interrogações e investigações setorializadas, particularizadas, que aprofundem o problema do “contato” TV-criança.

Se os tópicos e as considerações que se seguem chegarem a isso, deixando grãos de semente-idéia, então o Projeto estará continuando em cada leitor.

Parte I: Algumas considerações sobre a linguagem e o significado do meio televisivo.

1) “A TV é muito mais um processo do que um produto”: ela se apoia mais na RELAÇÃO que venha a estabelecer com o telespectador.

Por isso, a TV envolve sensorialmente o espectador, pois dá permanente oportunidade de participação. E quanto mais participação, mais envolvimento. A TV está sempre lutando, por seu lado contra a “baixa definição” (se deixar de informar um mínimo, fica confusa e insossa) — mas, por paradoxal que seja, se conseguir “definir” demais, também se tornará insossa e desinteressante.

(*) “Projeto Lobato”: desenvolvido de fevereiro a dezembro de de 1973 pela Fundação Centro Brasileira de TV-Educativa; tinha por objetivo pesquisar as características do “contato” de crianças (3-15 anos) com a TV. Durante o Projeto, foram realizados estudos bibliográficos preliminares; levantamentos tipo “survey”, sobre tendências de audiência à TV, entre a população infantil (3-15 anos) da GB; observações “de laboratório”, com crianças entre 11anos.

2) Na TV, ao contrário do cinema, o espectador é que é a tela… “A imagem feita no cérebro do espectador é o suporte da imagem criada no tubo do aparelho”. O espectador esculpe, escolhe, DEFINE a imagem (por isso se diz que a TV é de “baixa definição”). O próprio processo de formação perceptual da imagem da TV assegura essa necessidade de permanente “escultura”/”escolha”: a gente sabe que o que aparece realmente no vídeo é uma sucessão de pontos claros e escuros, aos quais a gente atribui forma e movimento.

A imagem da TV exige uma permanente “closura” (“fechamento” da imagem, para lhe dar um sentido), através de uma participação intensa, convulsiva, compulsória e super-sensorial do telespectador. O paradoxo dessa história toda é que esta tal participação, por intensa que seja, “não excita nem revoluciona”: apesar de tremendamente envolvido, o espectador não exerce sua vontade diante do que lhe é apresentado na telinha… Sua inteligência e sensibilidade, estas sim, parecem estar sumamente ativadas.

3) Ora, se a TV se apoia na participação e no envolvimento do espectador-escultor, a gente pode deduzir que os programas de TV mais eficazes seriam os que apresentassem processos “por completar” (“preencher os claros”…).

Seria o caso de “Fantástico”, ou “Vila Sésamo” ou “Repórter Espetacular”, ou do “Satiricom”?

4) Parece que as pessoas (as crianças, especialmente) acompanham mais reações que ações da narrativa televisual; as pessoas estariam assim interessadas em saber COMO está se passando. A telenovela é exemplo de um trabalho desenvolvido em cima do “tempo interior” das pessoas (se a gente prestar atenção na “estória”, vai notar que não é lá essas coisas…): interessa mostrar, na telenovela, como reagem as pessoas.

5) Parece pois que os meios eletrônicos trazem um novo tipo de significação — a significação do contrato. O que é que as tamente o que provocam. Isto conferiria vinhetas do “Fantástico” significam? Exa- TV uma incrível gratuidade — e um repertório “em aberto” de significados, porque os sinais passam a significar quando em contato com o espectador.

6) Por ser o meio tão abrangente que é, a TV torna próximo o espaço e a cena televisual (ao contrário do cinema e teatro, que precisam estar “fora”, longe do espectador) — a TV é um elemento doméstico, integrante da cena familiar. A TV É FAMILIAR. Por isso, as pessoas convivem com ela, com o que se passa nela. Os teleatores são familiares: são amados e odiados muito concretamente (ver o caso das agressões, na rua, aos vilões das novelas — apesar do sujeito se defender dizendo que não é o personagem, mas um ator). Quem reconhecido é Lauro Fontana, mais do que Milton Moraes; ou a tia Nara, no lugar de Neusa Amaral. Quem deu a notícia foi o Gontijo Teodoro, o Cid Moreira — ou o Heron Domingues, que era figura de alta credibilidade.

7) Outro dado de “desinauguração” permanente é a intimização com o SIMULTÂNEO, com o que está se passando “na realidade”. Assim, por exemplo, a Guerra do Oriente Médio, que começou de manhã, está à tardinha em sua casa (você, relizmente, fora dela…). E além do petróleo, vem direto o futebol de São Paulo, o Presidente no Amazonas, carnaval do Rio, fórmulas-1 na África do Sul, eleições em Portugal e a paz no Vietnã!

O que se passa por aí, portanto, é trazido “de bandeja” pra gente: e isso faz criar um novo vínculo com a realidade, porque a TV, curiosamente, faz crer que aquilo se passa “naturalmente”.

(Em síntese: — as pessoas acompanham mais reações que ações na TV; — a TV é um meio “frio”, de baixa definição: envolve o espectador, lhe dá muita oportunidade de participação; — mas este envolvimento é muito pouco crítico: o espectador se situa, ao mesmo tempo, envolvido e inativo; — em TV, o “arrumadinho demais” não funciona, pois tira do espectador sua função “esculpidora-definidora”; — os programas mais eficazes seriam, pois, os que deixassem coisas “em aberto” … — A TV É FAMILIAR!!! — A TV torna familiar o “simultâneo”).

Parte II: O “contato” criança & TV: Temática do Projeto Lobato

1) A colocação do problema — alguns persupostos teóricos

Há algumas teses, freqüentemente retomadas pelos teóricos que se dedicam à investigação nesta área, que delimitam o campo de pesquisa. Nos estudos prévios do “Lobato”, concentramo-nos em torno dessas:

a) a idéia de uma “indução psicomotora”, que converterá o comportamento visto na tela em conduta real;

b) a idéia de uma conservação e de cumulação deste efeito indutor;

c) a idéia de uma fragilidade própria ao adolescente e à criança, fragilidade muitas vezes super-estimada pelo adulto (inclusive os pesquisadores…);

Os estudos constantes da literatura podem ser arrumados em torno destes 3 pontos, segundo os quais se estudam:

a) as relações do espectador com a tela (écran) — abstraindo seu conteúdo;

b) as relações da mensagem televisual (conteúdo) com a estrutura de personalidade do espectador;

c) a natureza emocional-afetiva dos efeitos da recepção à TV;

A – O Efeito Ecrânico

Por sua característica de meio sensorial, como disse no início dos “considerados”, a TV pede uma medida capaz de precisar a “fecundidade da imagem” — o que constitui, de certa forma, um “efeito em si”. É justo este efeito-em-si que inquieta o público — mais que o texto dos programas.

É isso ainda que a crítica denuncia – o mundo fantasma da TV: “depois que o mundo nos vem em imagens, meio presente e meio ausente, é como que fantasma górico, e nós também nos tornamos fantasmas” (Gunther Anders).

O efeito ecrônico resultaria: na confusão entre o real e o imaginário — e no posicionamento especial (passivo? ativo?) do espectador face à mensagem televisual.

a.1) a “passividade” do espectador: super-controvertida; de toda forma Himmelveith, Wallon e Zazzo entendem que o espectador é super vigilante, e desenvolve uma forma ativa de atenção. “São as crianças que, na realidade, são mais ativas na relação — elas se servem da TV, mais do que a TV se serve delas”.

a.2) a confusão entre o real e o imaginário: a imagem é algo de muito concreto — e capaz de gerar uma realidade fantástica. A fronteira entre o real e o imaginário seria definida, naturalmente, pela capacidade da criança perceber o que aconteceu e o que não aconteceu “realmente”.

Aí é que os autores se dividem; quando é que as crianças começam a elaborar sobre esta distinção, esta fronteira entre o real e o imaginário?

Wilbur Schramm, ou Glogauer, (só para dar uma idéia da incerteza dos achados) acham que a pré-puberdade é uma época em que o caráter do fictício não é percebido; Gemelli inverte inteiramente a coisa: dos 6 aos 10, 12 anos, a influência da TV seria rara — e introduz o domínio da fantasia, dentro do qual a criança toma a ação televisual (ou cinematográfica) como um jogo. Se o filme for muito sério, isto é, faz referência “demais” à realidade, a criança não se interessa por ele.

De toda forma, a idéia de que a crian­ça diante da TV, “se esquece” pura e simplesmente de distinguir entre o real e o imaginário, parece duvidosa. Ou pelo menos (aí entra Sicker), a ativação de sua imaginação seria não menos febril que a suscitada pelo livro, pelo teatro.

Além disso, é também paradoxal exigir da criança que faça ali esta distinção, quando em tantos outros domínios ela também ainda não o consegue.

B – O Efeito “Pessoal”: Projeção & Identificação

Aqui se examina a questão da relação afetiva com as personagens dramáticas, contidas na TV. Só que a interpretação psico-sociológica deste fenômeno pode ser complexa. Morin fala desta “participação afetiva” do espectador através de dois mecanismos conjuntos: aidentificação levaria o espectador a imitar, na vida real certos aspectos da conduta de seus heróis; a projeção lhes permitiria viver, como que por “delegação”, certas emoções que só com dificuldade (fruto da imensa repressão em que vivemos), poderia exprimir na realidade.

As aproximações sistemáticas que se fizeram quanto a isso poderiam ser assim resumidas:

– a imitação direta do herói da TV, pelas crianças (adolescentes), é sintoma de um desajuste, que naturalmente deve ser buscado na vida da criança, não na tela;

– evidentemente, o tratamento do herói (“olimpianização”), tem uma referência direta a este quadro de desajustes (carências, aspirações, sentimentos agudizados pelo encontro da criança e adolescente com a realidade);

– a imitação identificativa pode ser circunscrita a comportamentos secundários (relações mais superficiais entre os sexos) — o agravamento disso remete ao 1.° caso (imitação direta).

C – O Efeito “Emocional”: Catarsis X Minesis.

Da discussão anterior, a gente desem­boca naturalmente numa nova oposição que caracteriza o suposto efeito da TV sobre a vida emotiva das crianças: a identificação remete à imitação (mimesis), a projeção seria “intermediadora” de condutas conscientes x não-conscientes (vicariante), gerando descargas “catárticas”. O efeito da TV sobre a estrutura afetivo-emocional das crianças constituiria uma espécie de “relé” (relay), continente/ conteúdo de cargas emocionais, regulador da relação entre o aspirado e o afetivado dá conduta. Só um exemplo — Himmel-weit: para ela, a TV é incapaz de gerar condutas agressivas, a não ser em crianças já definitivamente perturbadas — por outro lado, pouca coisa garante que os programas violentos (ou sumamente “afetivados”) sejam, benéficos; H. conclui que tais programas excitam a emocionalidade na mesma medida em que a descarregam. O que responde inclusive à questão do “efeito cumulativo” desta exposição à TV: se há condicionamento, há desconhecimento, diante das repetições de mensagens televisuais muito carregadas. A violência simbólica não é privilégio, nem idiossincrasia do meio-TV — que é só mais um “meio”: é uma marca da nossa época, registrando as formas que hoje escolhemos para nos relacionar.

2) “Projeto Lobato”: uma exploração indígena na área

Embassados em e circunscritos a esta área de investigação, pudemos desenvolver, nos 10 meses de vida do “Lobato”, alguns pressupostos teóricos (a nível de hipóteses), que por sua vez deram lugar a um esboço de princípios para uma tele-pedagogia infantil.

Tais pressupostos e princípios constituem os resultados parciais do trabalho. Se não podem ainda ser consistentes, não deixam de ser válidos. Apresento alguns deles à consideração do leitor, na esperança de que sua reflexão proporcione o aprofundamento que não nos foi possível efetivar.

a) Participação-extensão na mensagem: a TV parece ser muito mais um meio de incorporação das próprias energias potenciais da criança do que um meio transmissor de informações. Explico: o vídeo é algo estranho à criança (é um objeto cuja técnica ela não consegue elucidar) mas é ao mesmo tempo o seu “duplo” (o desejo das crianças em imagens).

O que está lá no vídeo, é o que ela gostaria de estar fazendo!

A familiaridade do espaço televisual funciona aí — para fazer com que as imagens que aparecem no vídeo sejam significativas do ponto de vista da existência cotidiana da criança.

Isso faz supor que os programas teleducativos para crianças (ao menos nessa faixa 7-11 anos) sejam basicamente deflagradores de ação (releasers), através de situações que instinguem ou provoquem intelectualmente a criança, e menos declaradores da informação.

b) Estrutura de mosaico: teóricos como Abraham Moles já haviam notado que os programas de TV obtêm maior impacto quando se constituem um mosaico de idéias simples, incisivas, expostas em poucos segundos e ligados de modo flexível.

Isso faz supor que não se deva impor um sistema rigorosamente lógico ou por demais concatenado ao telespectador infantil. Não terá grande sentido elaborar um programa de longa duração, com muita dose de informação, por mais bem realizado que seja. Um programa que combine a técnica do filme- flash com a técnica narrativa comum será o mais indicado’ para vincular mensagens educativas.

c) Exploração de redundância: observamos que as crianças freqüentemente “antecipam” cenas dos programas: em parte, por já deslindarem o teor da narrativa, em parte por já terem visto anteriormente aquele programa. Verificamos, assim, que a redundância(repetição da mensagem ou aumento do seu quociente de inteligibilidade), bem explorada, ajuda bastante ao público infantil de TV.

No nível dos adultos, isso corresponderia ao que chamamos de “prazer do sentido” propiciado por exemplo, por narrativas cujo desfecho já se sabe desde o início, mas que nem por isso são vistas com. menos interesse.

(Nos filmes seriados, como “Havaí 5-0”, “FBI”, “Cannon”, já se sabe sem surpresas que o mocinho vencerá os malfeitores, à custa de grandes façanhas, em geral inverossímeis). Prevalecerá aí o “prazer do sentido” sobre a “glória do sentido”: e a redundância das situações encenadas é o elemento que concorre para isso.

Achamos que, em programas teleducativos para crianças, seria interessante criar situações que pudessem ser antecipadas por elas, mesmo que se repetissem coisas já sabidas. Na repetição, a produção pedagógica buscaria preparar o caminho para informações novas.

d) Componência lúdica e afetiva das mensagens televisuais.

Diante da TV, a criança parece encontrar-se diante de um objeto que vai ser manipulado com finalidades de jogo. Assim, todo e qualquer fator que, de alguma forma, contrarie as aberturas e disposições lúdicas, parece ser sumariamente rejeitado.

As próprias crianças forneceram uma “pista”, que poderá ser muito fértil, toda vez que o programa educativo tiver uma estrutura dramática: a dramatização do que foi visto. Já haviamos observado que diante do vídeo, as crianças pareciam sentir-se estimuladas a fazer alguma coisa: manusear pequenos objetos, enrolar barbantes, folhear uma revista, embalar-se no ritmo da TV. Daí, nos vem a sugestão — na verdade, dada pelas próprias crianças que observamos — de que as crianças façam algo depois de assistirem ao programa de TV, vinculando esse “algo” ao conteúdo do programa. Por exemplo, um programa destinado a ensinar regras de trânsito poderá ser seguido de uma dramatização engendrada pelo próprio programa os garotos interpretam os guardas, os motoristas, os pedestres, os sinais luminosos, etc.

A dramatização permitiria à criança a reconstituiçao da cena produtora ou transmissora do conhecimento — ou mesmo a revisão de determinados desempenhos e papéis, no interior da instituição.

Parte III: Para um projeto de “Programação ativa pela TV”

1) TV educa porque ativa

1.1) Ao contrário do que se difundiu, via senso comum com boa dose de preconceito, nós agimos e elaboramos muito diante da TV, gerando um comportamento potencial e implícito altamente energético.

As emissões via TV, estas sim, é que parecem se preocupar muito pouco com isso. As emissoras, para ser mais direto, não se preocupam em “trabalhar” essa atividade (e nem em se alimentar dela, e nem em alimentá-la); mais atentas a índices de audiência, as TVs (especialmente as “comerciais”) cuidam em imobilizar o espectador, para mantê-lo cativo à sua emissão.

1.2) Por isso, uma TV-Educativa tem as condições de poder (e dever) manejar esse aspecto de transação mútua TV x Espectador — e de propor uma “TV ativa”!

Nela seriam considerados:

– o feedback dessa ativação gerada pela própria TV, seja através de programas-crítica a outros programas; seja através de outras formas de comunicação do público para TV, como cartas, respostas e exercícios, questionários como os que foram elaborados para a novela “João da Silva”.

– a ativação prévia dessa “presença ativa” da TV nos diferentes meios: escolas, associações de bairro, igrejas, etc. Até nas próprias casas. Exemplo: no envio de material de apoio, ou na simples divulgação dos “programas-ativos” por outros meios que não a TV.

– O feedback experimental, através da pesquisa da natureza do contato de grupos-de-controle com esta “programação ativa” (o que define, a nosso ver, uma continuação possível do Projeto Lobato).

– a fixação dessa “ativação” através de outros meios, por exemplo: organizando, nas escolas, redações ou dramatizações sobre o conteúdo veiculado na programação;

1.3) Com isso, é de se supor o aumen­to do nível de eficária pedagógica da própria TV-E: elarealizar coisas, na medida em que propõe “programas ativos”. Quem sabe, aqui se abre uma outra (e nova) perspectiva para o medium: a TV Ativa…

2) Que tipo de programa pode ser “ativo”?

2.1) O mais comum é ouvirmos criticas pesadas às atuais programações infantis da TV: normalmente, as pesquisas se fazem “contra” a TV, mas não “a favor” do telespectador (como as campanhas “contra” o analfabetismo, mas nunca “a favor” do analfabeto…).

2.2) Assim, as propostas concretas para uma programação televisiva infantil são esparsas, e bastante localizadas (como “Vila Sésamo”); os estudiosos, por desconhecerem a técnica, a linguagem e os processos de produção da TV, ficam no plano das “recomendações'” — necessárias, mas insuficientes… (ao menos para por um programa no ar).

2.3) As características dessa “programação ativa” seriam:

a) considerar os pontos descritos anteriormente: feedback de público, ativação prévia, feedback de grupo-controle; eles configuram o contexto em que essa programação vai ao ar. São seus elementos de apoio.

b) apoiar-se no pressuposto pedagógico de que “o mais importante para criança (especialmente em idade pré-escolar) é aprender a se relacionar (controlar) o meio ambiente”.

c) por isso, a programação se voltaria para a abordagem de situações de vida de criança, enfatizando os elementos que delinem e clarificam a perceção que a criança tem de si e do mundo (ver mais adiante a temática).

Basicamente, essas situações de vida vão se referir:

– à relação da criança com o adulto e com as outras crianças – ação socializada;

– à sua relação com os instrumentos e meios da ação da criança no seu mundo;

– às consequências do uso desses meios e instrumentos sobre as coisas (a criança como agente de transformação — portanto, sujeito de sua própria ação!)

Número Especial – Agosto, 1976

3) Que conteúdo terão essas “situações”? (temática dos programas)

Só para situar mais concretamente a proposição, alinhamos alguns temas-suporte de uma programação:

– O êxito e o fracasso para a criança

– O espaço e o tempo para a criança

– O dinheiro e o valor

– O grupo

– A mentira e a verdade

– O não-fazer-nada

– O ritual

– O humor

– O jogo

– A musicalidade

– A bagunça

– A “origem das coisas”

– A construção

– Etc.

Ao Final

O crítico Artur da Távola vem levantando há tempos a bandeira da “TVE, uma televisão para crianças”. Entende ele que o esforço de produção das TVs Educativas deve ser concentrado na elaboração de programas infantis. Que se crie uma “Central de Produções”, para melhor utilização de recursos — e que esta alimente, através de tapes, a programação infantil das emissoras do país (educativas e “comerciais”). Antecipa ainda o crítico, o grande papel que terão, como recursos auxiliares na Educação, os sistemas fechados de TV e os sistemas de reprodução-repetição de programas (como o vídeo-disco e o vídeo-cassete).

De qualquer forma, a plena utilização do meio-TV — para fins educativos — supõe o envolvimento dos educadores, na criação, produção e veiculação de programas. Até agora, os educadores guardamos, em relação a TV, uma distância meio respeitosa, meio preconceituosa. Quando essa distância diminuir, os educadores vão poder aumentar em muito a eficiência dos processos instrucionais. E vão perceber também que, na verdade, a TV não passa de um “gigante tímido”…

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José Renato Monteiro
É psicólogo, graduado em Psicologia da Comunicação, Consultor da Fundação TV Educativa, diretor de criação da Líder Vídeo Comunicações Audiovisual.

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Obs.
Este texto foi retirado da edição especial da Revista de Teatro da SBAT, referente ao Seminário de Teatro Infantil de 1975, organizado pelo antigo Serviço Nacional de Teatro, do MEC, realizado no Auditório Salvador de Ferrante da Fundação Teatro Guairá, em Curitiba, no período de 3 a 7 de fevereiro de 1975.

Fazem também parte desta Revista os seguintes textos:

Apresentação do Seminário de Teatro Infantil – 1975, de Orlando Miranda de Carvalho e Beatriz Veiga
A Criança e a Linguagem Televisual, de José Renato Monteiro
A Coragem de Fazer Teatro Infantil, de Maria Helena Kühner
A Propósito de um Concurso de Textos para Teatro Infantil, de Oscar Von Pfull
Desenvolvimento da Linguagem Teatral da Criança, de Helena Barcelos
Possibilidades do Teatro como Processo Educativo, de José Antônio Domingues
Observação Pessoal sobre o Julgamento de Textos para Teatro Infantil, de Zuleika Mello
O Mundo Subjetivo da Criança e sua Interação com o Teatro, de Monica Laport
Realidade Atual do Teatro Infantil no Estado da Guanabara, de Ana Maria Machado
Teatro, Educação Tridimensional, de Joana Lopes