A magia dos bonecos foi incorporada ao espetáculo dos Trovadores

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 26 .09.1998

 

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O encanto irreverente dos bonecos 

O grupo de contadores de histórias Os Trovadores, formado há 10 anos, ampliando a sua técnica no novo espetáculo, O Cordeiro de Lã Dourada, em cartaz no Teatro Ziembinsky, traz agora ao palco a história contada em movimento. O recurso usado á a manipulação de bonecos. E neste vasto mundo do teatro de manipulação, o grupo escolheu o mais irreverente dos títeres: Os Bonecos de Santo Aleixo.

A técnica do varão – bonecos manipulados por duas hastes por cima do palco – é encenada num retábulo de madeira que reproduz um palco em miniatura. Esses bonecos de movimentos duros, quase socados ao solo, não tem o molejo dos bonecos de luvas, nem a precisão de movimentos das marionetes de fio, mas são sem dúvida os mais bem-humorados.

Os originais, os do Centro Cultural de Évora, que serviram de inspiração aos Trovadores, seguem a tradição de abrir seus espetáculos com o baile dos anjinhos, onde são criados o sol e a lua. Depois disso tudo, podem acontecer até cenas de texto mais picante envolvendo um primo e suas primas, ou um velho e suas vizinhas e por aí vai. Este teatro não é bem dirigido ao público, mas faz o maior sucesso com a plateia adulta.

A técnica não tenta reproduzir fielmente os movimentos humanos, ao contrário, não deixa a menor dúvida de que o que está em cena são bonecos que podem sair de cena “voando” por cima do palco. Mas fiel à realidade são o seus cenários em perspectivas e a rápida mudança de ambiente. Assim, a história se conta como o passar de páginas de um livro lindamente ilustrado.

Fernando Santana, diretor do espetáculo, e bonequeiro de mão cheia, optou por não reproduzir a técnica na íntegra, mas utilizá-la com mais um elemento cênico. Assim, o espetáculo mistura bonecos e atores para contar sua história. A trama milenar, mais conhecida na versão dos Irmãos Grimm, conta à história de um pastor que trabalha durante um ano inteiro e quando vai receber escolhe como salário O Cordeiro de Lã Dourada, uma espécie de talismã mágico que vai grudando em tudo que se interpõe em seu caminho. Nessa trajetória seguem na procissão: uma menina, a pasteleira, o velho da aldeia e quem mais chegar.

Neste conto simples, sem muitos atalhos, Fernando Santana tem o melhor do seu espetáculo, que é a experimentação da técnica de Santo Aleixo pelo grupo Os Trovadores, que se revela ótimo manipulador. Porém, a interferência dos contadores no palco acaba quebrando a concentração do público já tão envolvido com o maravilhoso teatrinho dos bonecos.

A impressão que se tem é que não se acreditava muito que títeres e contadores fossem se dar tão bem. A opção Não é nova nem imprópria como comenta o autor Michel Meschke: “Não é crime misturar bonecos com atores vivos… não é crime acreditar que o artista é capaz de descobrir e de apresentar algo inteiramente novo e diferente… Qualquer coisa que você faça, o importante é porque você o faz e o que quer dizer!”. Assim, valeu a experimentação.

Cotação: 2 estrelas (Bom)