Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 04 .08.1996
Sarau literário em formato de peça intimista
Conversinha Mineira, em cartaz no teatro do Museu da República, faz parte do Projeto Crônica em Cena, cujo objetivo é reverter para o palco crônicas, contos e romances numa linguagem o mais teatral possível sem que, no entanto, se perca o tom intimista literário, com que a obra foi criada. E é nesse clima aconchegante que o espetáculo acontece.
Com direção de Cândido Damm para dois atores em cena – Paulo Heusser e Tracy Segal, o autor escolhido é Fernando Sabino. A mineirice exagerada, e muitas vezes caricata, foi suprimida, ficando o alvo da encenação na qualidade e inspiração do autor, em histórias que poderiam estar acontecendo em qualquer lugar do mundo, ou pelos menos do Brasil.
Os nove contos recortados da obra de Sabino são uma mostra não dos mais regionais nem dos mais conhecidos. Mas, sem dúvida nenhuma, uma mistura equilibrada que chega ao palco na medida exata para fãs do autor ou mesmo para quem ainda não o conhece.
Confusão com São Pedro, o primeiro conto encenado, é a história de um casal, que, no aeroporto, resolve que deve viajar em aviões separados. Caso o avião caia, a família não fica tão desfalcada. Na turbulência, todo tipo de barganha. O Agrônomo Suíço é uma conversa truncada ao telefone, ao som ambiente de um bar para lá de animado. Gente direita mostra o encontro de dois bêbados que, sem muito assunto, concordam que bom mesmo é história de família. Festa de Aniversário é sobre a confusão que se arma quando o aniversariante declara que engoliu uma tampinha de refrigerante. Dez Minutos de Idade é um conto de Fernando Sabino musicado por Caíque Botkay. Albertina, talvez a história mais conhecida do espetáculo, trata da difícil relação patrão-empregada, quando a última entende tudo ao pé da letra. Conversinha Mineira, o conto-título e talvez mais saboroso, é a lógica mineira em sua perfeita tradução. Uma pequena mostra do que é conversar desconversando. Os dois últimos contos. O Melhor Amigo e Hora de Dormir, fecham a cena como se o espectador pusesse no livro um marcador para depois continuar a leitura.
O tom intimista revelado na direção de Cândido Damm, tanto para a encenação quanto para a performance dos atores, é um dos achados do espetáculo. Sem teatralidade excessiva que se sobreponha a idéia de pôr os contos em cena, Damm é fiel à proposta do projeto literário sem resultado didático. Na mesma linha, Paulo Heusser e Tracy Segal, coringam vários personagens femininos e masculinos sem caricatura.
A trilha recolhida por Caíque Botkay, tocada ao vivo com voz e violão de Marcos Paulista, inclui hits para iniciados como o Love Tray e Die, de um dos primeiros LPs da Gal, entre outras canções marcantes, mas não muito populares. A luz de Aurélio de Simoni fecha o clima deste sarau literário em precisa interferência.
Conversinha Mineira é um teatrinho sem tom pejorativo, bom pra qualquer idade.
Cotação: 2 estrelas (Bom)