Cinderela é narrada por um rato, uma gata e uma cadela

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 26.08.1995

 

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Borralheira ganha musical 

Originários da China, Cinderela e o macarrão são dois produtos que se popularizam em outras terras. A história da mocinha do borralho que, enfim, ascende a uma nova posição social através do casamento, já foi recontada de muitas formas diferentes. Todos os anos novas versões são lançadas, confirmando a tese de que cada vez que se chega ao final de uma história, onde todos “foram felizes para sempre”, ouve-se invariavelmente uma “conta outra vez”. No palco, não acontece diferente.

O texto de José Wilker para Cinderela inclui no enredo um rato, uma cadela e uma gata que, depois de encontrarem o livro de histórias, ganham de uma prima de fada-madrinha o dom de lerem e de participarem da saga da Borralheira. Armado com a estrutura de um musical, onde as letras das canções ilustram a cena, o espetáculo pode ser visto, até a história se contar por completo.

Mas se o texto propõe variações, falta à direção de Eduardo Martini um melhor acabamento. Com passagens lentas, ampliadas pela deficiente qualidade de operacionalização sonora, as trilhas chegam truncadas à plateia, dificultando o entendimento do enredo. O tom histriônico de personagens como a madrasta e suas filhas, mais as cenas solo da fada-madrinha, acabam deixando para Cinderela e o Príncipe papéis de quase coadjuvantes. Mesmo em seu ponto forte, como é ocaso da coreografia, que vem assinando em outros espetáculos – A Menina e o Vento, por exemplo -, Martini não alcança o mesmo brilho. Fato inexplicável, levando-se em consideração a participação no elenco de Flávia Rinaldi, Totia Meirelles e do próprio Eduardo Martini – três atores que sempre se destacam em musicais.

Os elementos complicadores, no entanto, não atrapalham o divertimento da plateia. No palco, quase como num show, Bia Montez (a madrasta), Luisa Thiré (Teolinda) e Kika Freire (Teobela) são um trio no melhor do mau humor. Numa outra linha, usando mais os recursos dos clowns, Eduardo Martini (o arauto) e José Luiz Perez (O corneteiro) estão afinados em seus papéis. Totia Meirelles, mesmo abusando dos gestos umbanda/ candomblé para compor sua fada, se comunica favoravelmente com o público infantil. Flávia Rinaldi é uma Cinderela dentro dos padrões, mas Ronaldo Vianna, o príncipe entediado, não sai do personagem nem quando encontra sua musa. Os contadores da história, Renato faria (o rato), Giovanna Albuquerque (a cadela) e Stella Rabello (a gata) ganham a simpatia da plateia instantaneamente.

Apostando no impacto visual, Cinderela tem cenários muito eficientes, assinados por Cláudio Torres Gonzaga e Eduardo Martini, e figurinos coloridos de Marco Aurélio. Esses elementos, somados a trilha musical de Caíque Botkay e Alexandre Negreiros, fazem do espetáculo um bom divertimento

Cotação: 2 estrelas (Bom)