Crítica publicada em O Globo – Segundo Caderno
Por Marília Coelho Sampaio – Rio de Janeiro – 17.10.2004
Caia na Gandaia: Um espetáculo que tem todos os ingredientes para agradar às crianças, aos seus pais e aos seus avós
Em ritmo de chanchada do cinema dos anos 50
O ritmo de Caia na Gandaia é o mesmo das chanchadas, herdeiras cinematográficas do teatro de revista que atingiram seu auge nos anos 50. Nesse musical infanto-juvenil da Cia. Dramática de Comédia, em cartaz no Teatro II do Centro Cultural Banco do Brasil, os atores, inspirados pelos grandes comediantes daquela época, exploram ao máximo os efeitos das caras e bocas e aproveitam muito bem as piadas levemente picantes do texto para conquistar o público.
Todas as situações cômicas da peça se desenrolam a partir do momento em que Pitanga, um conhecido produtor teatral, resolve montar um espetáculo baseado em Helena de Tróia. Decidido a fazer uma peça séria, ele contrata o professor Xenofontes, que sabe tudo sobre a Grécia, para escrever o texto. Só que ele acaba encontrando uma forte resistência ao seu projeto, encabeçada pela dupla de autores, Picolé e Tião, com apoio de Lolita, uma cantora cubana, e de Eliana Santoro, a protagonista do espetáculo: todos preferem atuar numa comédia musical.
Peça foi inspirada no filme “Carnaval Atlântida”
Inspirado pelo filme “Carnaval Atlântida”, de 1953, João Batista cria um texto bem amarrado e divertido, que dá boas oportunidades aos atores de exibirem seus talentos. Édio Nunes, que vive os personagens Picolé e Cigana, está totalmente integrado ao espírito do espetáculo: ele canta e dança muito bem, além de ter o tempo certo da comédia. E seu trabalho em dupla com Jorge Maya – um pouco acima do tom em algumas cenas – como Tião, também é muito produtivo, arrancando boas gargalhadas da plateia. Da mesma forma, Eduardo Rieche é muito feliz na composição do tímido e atrapalhado professor Xenofontes, deliciando o público no número musical do mambo, contracenando com Sonia Praça, uma cubana caliente. Cleiton Rasga e Giselda Mauler formam outra divertida dupla nos papéis de Pitanga e Eliana. Na realidade, todo o elenco dá conta do recado, seja cantando, dançando ou representando.
Marcelo Neves faz um ótimo trabalho na autoria dos temas instrumentais inseridos entre as cenas, que nos remetem de imediato às trilhas compostas para o cinema mudo, e na direção musical. As músicas da peça, tocadas ao vivo por Adriano Souza (piano), Dôdo Ferreira (baixo acústico) e Jamir Torres (bateria), incluem desde antigos sucessos como “No tabuleiro da baiana”, de Ary Barroso, até canções especialmente compostas por Paula Leal e João Batista. Todas elas muito bem integradas ao espetáculo, assim como as divertidas coreografias de Sueli Guerra.
O colorido cenário de Doris Rollemberg, composto por alguns painéis, por dois coqueiros estilizados e três colunas gregas, está perfeitamente adequado ao pequeno espaço do palco e, em diferentes momentos, contribui com os números cômicos dos atores. A iluminação de Renato Machado utiliza cores quentes, em especial o vermelho, reforçando o clima tropical do espetáculo. Os figurinos de Mauro Leite, muito bem cuidados e divertidos, só parecem um pouco exagerados na primeira aparição da dupla Picolé e Tião e no exacerbado mal gosto de Lolita, que mistura num mesmo vestido estampado de oncinha com franjas de diferentes cores.
Caia na Gandaia, um espetáculo muito bem dirigido por João Batista, tem todos os
ingredientes para agradar crianças, aos seus pais e – por que não? – aos seus avós.