Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 14.04.2000

Barra

500 anos bem contados

Navegando nas perigosas águas do teatro-evento, o diretor Marcelo Mello, o mesmo do delicioso espetáculo Contos e Cantigas Populares, é desta vez o responsável por colocar em cena uma outra história do Brasil. História esta que explodiu nos palcos por ocasião dos 500 anos e que até agora só tem nos dado bons espetáculos, ao contrário de outras peças temáticas, como as do ano da ecologia (1992), que com honrosas exceções redundaram num show de mesmice que só menosprezavam a inteligência da jovem plateia.

Brasil de Lá pra Cá, em cena no Teatro Cândido Mendes, é um painel histórico que começa com o descobrimento e vai até a abolição da escravatura, com texto adaptado pelo próprio Marcelo do original de Pedro Dantas e Camila Rudner. Um tanto fragmentado e pressupondo que o espectador já esteja íntimo da trama, as cenas se desenrolam com excesso de personagens e informações telegráficas sobre o acontecido. Assim, para não perder literalmente o bonde da história, a plateia tenta seguir o enredo que passa como um clip no minúsculo palco do teatro. Em cena, resumidamente: Cabral, Caminha, Pedro I, Padre Antônio Vieira, índios, jesuítas, escravos, Carlota Joaquina, Tiradentes, Dona Maria I e a Princesa Isabel. Só para citar alguns.

Mas se a história corre um tanto truncada, o teatro que está no palco é de primeira. Com um quarteto de excelentes atores – Camila Rudner, Luciana Borghi, Guilherme Miranda e Leonardo Miranda, o diretor desenvolve sua linha muito particular de humor e traz a cena um espetáculo leve e delicadamente musicado ao vivo. Tirando o máximo de seus atores, muito mais do que a história do Brasil, está em cena a força do teatro de ator, e este deve ser sempre comemorado.

Para envolver o jovem expectador com o enredo, Nívia Semprini criou um cenário que muito lembra um quarto de brinquedos. Do baú cenográfico são tirados os bem-acabados adereços que compõem as épocas. Os figurinos de Flávia Bitencourt, também usando adereços, agilizam as muitas passagens de tempo. Ainda na linha do humor, a trilha musical de Guilherme e Leonardo Miranda vai do clássico à marchinha de carnaval abusada, como Índio quer apito e outras pérolas do gênero. De complicada técnica a iluminação de Wilson Reis, um tanto burocrática no acende e apaga, que por muitas vezes deixa o ator falando no escuro. E esse não é um grifo de comicidade, mas um erro de operação mesmo

Brasil de Lá pra Cá é um espetáculo de humor que, apesar da quilométrica história contada, diverte a plateia pelo talento de seus atores e diretor. Uma tesourinha afiada só faria bem ao texto.