Os atores-dançarinos de Bichos do Brasil: belos figurinos no palco

Crítica publicada em O Globo – Segundo Caderno
Por Marília Coelho Sampaio – Rio de Janeiro – 27.03.2005

 

 

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Bichos do Brasil: Espetáculo só se distancia do público infantil ao abrir mão de ação dramática

Cores, ritmos e danças que encantam!

O espetáculo Bichos do Brasil, em cartaz no Teatro do Jockey, é um híbrido de dança, teatro, música e artes plásticas, ou seja, é um típico produto da nossa época. Embora a companhia pau­lista Pia Fraus exista há 20 anos, a montagem nos revela que ela está antenada com as transformações que marcaram as artes cênicas nas últimas décadas.

Críticar um espetáculo que não se encaixa numa determinada linguagem artística não é tarefa das mais simples. Mas, como é praticamente uma necessidade nos tempos que correm, vamos procurar analisar Bichos do Brasil observando suas especificidades e pontuando os momentos em que se afasta e em que se aproxima do público infantil.

Atores manipulam bonecos todo o tempo

O espetáculo é divulgado como “um alerta para evitar que ocorra a extinção de nos­sos animais … “. Esse tipo de propaganda leva a uma expectativa de que haja, no conteúdo da montagem, algum tipo de manifesto em prol da ecologia, da preservação do meio ambiente, enfim, do cuidado com a vida no planeta Terra. Logo nas primeiras cenas, os três atores entram no palco dançando e manuseando bonecos com formatos de diferentes animais. O que, a princípio, parece a introdução da peça, acaba se prorrogando por todos os 40 minutos da apresentação. E isso não deixa de ser uma frustração para quem espera que, em algum momento, vá existir algum tipo de história envolvendo aqueles “personagens”. Talvez esteja aí o problema: eles não são personagens, são apenas animais que desfilam pelo palco, muito bem manipulados pelos atores.

Mas isso se caracteriza como um problema? Se tentarmos ver o espetáculo como teatro, poderemos dizer que sim, na medida em que, durante a encenação, as crianças fazem várias perguntas aos seus pais, que ficam sem resposta. Como por exemplo, a quais espécies pertencem aqueles animais? Qual a ligação entre eles? Quais deles estão ameaçados de extinção? Nada disso é comunicado ao público infantil. Há algumas tentativas dos autores de criar pequenas cenas, não se pode negar. Como na passagem em que o jacaré abocanha os pássaros, ou no namoro entre os miquinhos, que voltam à cena com seus filhotes. Mas na maior parte do tempo acontece apenas uma bela e criativa exposição dos bichos da nossa fauna.

Se tentarmos olhar o espetáculo como dança-teatro ou – quem sabe? – como dança, poderemos dizer que ele é muito bem elaborado, praticamente irretocável. Os atores-dançarinos Beto Andretta, Viviane Porto e Adriana Telg transformam se em belas figuras no palco. Além de demonstrar um ótimo preparo corporal, o trio também cativa o público infantil com suas expressões faciais e com a intimidade com que se relaciona entre si e com os bonecos.

Luz, música, figurinos e coreografia impecáveis

A parte técnica não deixa brechas para restrições. As coreografias de Key Sawao e Ricardo Iazzetta, além de muito graciosas, encaixam-se com perfeição na relação dos atores com os animais. A trilha original composta por Gustavo Bernardo e Marcos Boaventura, que mistura diferentes ritmos brasileiros, mexe, literalmente, com a plateia – em alguns números, as crianças menores chegam a se levantar para dançar e bater palmas. A iluminação de Beto Andretta e Hugo Possolo aquece o palco, valorizando as cores vibrantes do figurino e dos animais. E a criação dos bonecos, o cenário e o figurino, de Beto Lima, são uma atração à parte no espetáculo.

Sendo assim, podemos dizer que, independentemente de ser teatro, dança ou dança-teatro, Bichos do Brasil é um espetáculo muito bem cuidado pelos diretores Beto Andretta, Beto Lima e Hugo Possolo. E que, sem dúvida, encanta as crianças, sobretudo as pequenas, que ficam fascinadas pelos bonecos, pelas danças, pelas cores e pelos ritmos que se misturam no palco.