Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 06.11.1976

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O anticonformismo de Azul ou Encarnado?

Texto vencedor do último concurso de dramaturgia infantil realizado pelo Serviço Nacional de Teatro, Azul ou Encarnado?, de Maria Arminda Fallabela de Aguiar tem a seu favor vários aspectos positivos. Inicialmente, o tema: exortação a uma vida alimentada pela autenticidade, na qual o ser humano caminha (“o importante é caminhar”) mesmo que seja longo o tempo e bem distante o lugar. Azul ou Encarnado? mostra, através da história da princesa que deseja saber o que significa ser feliz, que a vida deve ser vivida de uma maneira dinâmica e enriquecedora, deixando de lado todas as (falsas) vantagens do conformismo e da passividade.

O segundo “gol” marcado pela autora refere-se à fonte utilizada para defender seu ponto de vista: o pastoril. A explicação dada por Maria Arminda em sua “nota introdutória” prescinde de qualquer acréscimo:

“Quanto ao público a que se destina o nosso texto, que imaginamos na fase final da infância, acreditamos ser do maior interesse colocá-lo em contato com a nossa tradição dramática e com as formas folclóricas das celebrações natalinas brasileiras, hoje tão esquecidas em proveito de modelos de importação, desvinculados, historicamente, da cultura nacional”

É isso. E Maria Arminda atinge bem a sua meta. Escrita em versos, a peça mostra uma autora com amplo domínio formal. Não se pense, porém, que, por ser em versos, a peça cheire “a coisa velha” (Gota D’água está aí mesmo!). Azul ou Encarnado? vive o tempo presente e seu alcance está, na realidade, para a faixa mais próxima da adolescência, em que já há capacidade para a percepção de todas as sutilezas do texto.

O Grupo Quintal, vencedor do Molière do Teatro Infantil através de Maria de Lourdes Martini, diretora do espetáculo, nos oferece mais uma montagem bem cuidada, musicalmente charmosa e com uma produção artesanal da melhor qualidade (ver as máscaras dos ministros feitas a partir de buchas de tomar banho). A direção mais uma vez conseguiu o milagre de movimentar expressivamente a “multidão familiar” que forma o elenco naquele minúsculo palquinho. A montagem obtém o clima de festa popular proposto pelo texto e a busca efetuada pela princesa é mostrada com um desenvolvimento crescente. O elenco funciona com firmeza, apesar de deixar a impressão de que curtia muito mais fazer a Estória da Moça Preguiçosa. Azul ou Encarnado? é um bom espetáculo, recomendado principalmente para as crianças maiores.