Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Eliana Yunes – Rio de Janeiro – 27.06.1987
Desventuras de um herói-menino
Em busca de espaços alternativos, o teatro infantil anda experimentando novos dias e horários, discotecas, e agora chega a casas noturnas: Aventuras de Tizinho está no Oba-Oba, no Humaitá. Livre adaptação da obra de Leandro Tocantins (Memórias de Tizinho), o espetáculo se quer, mais que uma peça, parte de um projeto em defesa e resgate
das lendas e folclore brasileiros.
Nas escolas, o musical se desdobra em palestras e debates com as crianças, que concorrem a uma viagem à Amazônia, se sua redação e desenho forem premiados por um júri presidido por Rachel de Queiroz. Isto é, o caráter didático do projeto se expande para além do assistir à peça, e o espectador deve expor à avaliação sua leitura da montagem.
É justamente nessa intenção de salvar o que está perdido, desenvolver pedagogicamente o projeto, que muita coisa se complica. A larga experiência de seu diretor, Vital Filgo, não evita a armadilha. Procurando didatizar a mensagem, divide o espetáculo em duas partes, que têm nítida dificuldade de se articular em um só ato. Iniciando com a crítica à exploração da região por mãos estrangeiras, faz uma caricatura do Tio Sam/Tarzan, coadjuvado por Kiruba, um
secretário tonto.
Como sempre acontece, na selva os bichos se dividem com a chegada do estrangeiro, e o mal vai ser personificado por um animal “pré-histórico e mal cheiroso”, adjetivação que evidencia o preconceito e estabelece o maniqueísmo, ao contrapô-lo ao Irapuru, “decanto lindo e representante da unidade da mata”. Em troca da ajuda para roubar a flauta mágica do Uirapuru, a tartaruga lhe revela os segredos da selva. Os bichos, reunidos em conselho, decidem por uma
estratégica ingênua de “perda” e despedir os estrangeiros – coisa de que se encarrega Tizinho, menino que vai ser também incumbido de recuperar o talismã da felicidade de todos. Assim se inicia a segunda parte, em que, motivado pela desventura da exploração estrangeira, ele faz uma viagem pela Amazônia que o coloca diante das figuras místicas que narram suas lendas – propósito último do espetáculo.
O périplo, no entanto deságua em solução estranha ao caráter mítico deste ato: o objeto buscado – “está dentro da gente, e isso ninguém pode levar” – o som final se torna apelo emocionado de Tizinho pelo resgate e preservação das
lendas. A peça, portanto não consegue manter um diapasão, apesar das boas composições de Elias Jabor, que experimenta ritmos diversos, procurando marcar psicologicamente as personagens e os momentos através da música. Destaque para Bia Gemal vestindo a pele da tartaruga e para Carlos Arruda enquanto Tarzan.