O elenco de Auto da Compadecida: tempo para se aprimorar

Crítica publicada em O Globo – Segundo Caderno
Por Marília Coelho Sampaio – Rio de Janeiro – 19.12.2004

 

 

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Auto da Compadecida: Montagem tem várias qualidades, mas reflete a inexperiência do grupo

Peça de Suassuna para crianças

Está em cartaz no Teatro Candido Mendes, em Ipanema,Auto da Compadecida, texto de Ariano Suassuna encenado pela Cia. Teatral Mãos à Arte. A proposta do grupo formado por jovens atores é apresentar ao público infanto-juvenil o Ciclo Ariano Suassuna para Crianças, o que não deixa de ser uma boa ideia.

O “Auto” gira em torno das aventuras do esperto João Grilo e de seu amigo Chicó, experiente na arte de contar causos. Sempre pensando em se dar bem, a dupla acaba criando uma série de confusões. Tudo começa quando os dois tentam convencer o padre do lugar a benzer o cachorro da mulher do padeiro. Para isso, eles não hesitam em enganá-Io, fazendo com que ele pense que o bichinho pertence ao major Antônio de Morais, o todo-poderoso da região. E o desenrolar da história é cheio de surpresas, com a entrada em cena do bispo, do major, do matador Severino, de Jesus, da Compadecida e até do Demônio.

Texto divertido já é conhecido do público

O divertido texto, que ganhou adaptações para o cinema e para a televisão, já é bem conhecido pelo público adulto e, possivelmente, pelas crianças, que hoje em dia estão antenadas com tudo que acontece na telinha e na telona. Enfim, talvez o que mais interesse aqui seja a forma encontrada pelo grupo de contar essa história.

O cenário de Amanda Fernandes e Raquel Buarque, formado apenas por alguns caixotes de madeira e por duas escadas de armar, é muito despretensioso. Mas como o pequeno palco do Candido Mendes não permite muitas extravagâncias cênicas, a simplicidade do cenário não chega a comprometer a montagem. O figurino de Giovani Targa, que utiliza retalhos em roupas coloridas, está bem de acordo com o espírito da obra de Suassuna. E a iluminação de Milton Filho é correta, assim como a maquiagem de Alexandre Rodrigues.

Excesso de referências deixa elenco meio perdido

A direção de Marcos Cabral tem alguns pontos positivos e outros que precisam ser revistos. Ele cria algumas cenas bem divertidas, como a dos saItinhos dos atores em resposta às falas de seus interlocutores, ou a do encontro de Grilo e Chicó com o matador. Mas encontra dificuldades na concepção do espetáculo como um todo e na direção dos atores. Através do release, ficamos sabendo que Cabral recorre a diferentes técnicas, como a da commedia dell’arte, a do circo, a da bufonaria e a da dança. Talvez a mistura de todas essas referências, sem real aprofundamento em nenhuma delas, tenha deixado o elenco, formado por atores ainda inexperientes, bastante perdido em cena.

A direção musical, do próprio diretor, também deixa a desejar – o que é uma pena, já que o elenco dispõe de uma série de instrumentos musicais que, se melhor utilizados, poderiam dar um colorido especial à montagem. Mas como o grupo só tem dois anos de existência, ainda terá muito tempo pela frente para se aprimorar.