Crítica publicada em O Globo – Segundo Caderno
Por Marília Coelho Sampaio – Rio de Janeiro -2003
Grupo Ato Ativo de Teatro estreia no Glória com texto clássico
Um primeiro trabalho com acertos e deslizes
Para encenar sua primeira peça, o grupo Ato Ativo de Teatro escolheu um texto de Martins Pena, “O Judas em Sábado de Aleluia”, que, na adaptação de Lulla Dias, ganhou, o título de As Trapalhadas do Soldado Faustino. O espetáculo, dirigido por Jacqueline Winter, faz temporada nos fins de semana no Teatro Glória, mesclando acertos e deslizes.
O maior acerto do grupo foi a escolha do texto. A adaptação de Lulla Dias é bastante fiel ao original de Martins Pena. Ele apenas enxuga as falas mais longas dos personagens e suprime as cenas em que os personagens infantis divertem-se com o Judas. Na realidade, Lulla minimiza a importância da festa do Sábado de Aleluia, transferindo o foco do espetáculo para o esperto soldado Faustino, que começa a peça apaixonado por Maricota e acaba pedindo em casamento a mão de sua irmã, Chiquinha. Isso, depois de descobrir o verdadeiro caráter de Maricota e desvendar as mutretas de Pimenta (o pai das moças), com o trambiqueiro Antônio.
Mas as pequenas mudanças não comprometem em nada a divertida comédia de costumes de Martins Pena. E as crianças, curiosamente, acompanham muito bem a história que, no original, passa-se em 1844. Talvez porque tanto os falsários quanto
as mocinhas que fazem todo tipo de intriga para conseguir um bom partido continuem firmes e fortes por aí.
O elenco é heterogêneo e a iluminação, precária
Se o grupo foi feliz na escolha e na adaptação do texto, encontrou algumas dificuldades para encená-la. Uma delas é o tom farsesco – ou seja, a comicidade exagerada – proposta pela diretora Jacqueline Winter.
Nem todos os atores do elenco conseguem alcançar o tempo da farsa e alguns acabam caindo na caricatura. É o caso de Johnnatan Monteiro, que vive o capitão Ambrósio, e o de Cristiano Queiroz, o Sr. Antônio. Também não são muito felizes duas cenas interpretadas pelos dois atores: aquela em que o capitão tira demoradamente uma meleca do nariz e outra em que Antônio assua o nariz e aperta a mão do Sr. Pimenta. Elas são desnecessárias, pois não surtem o efeito desejado: o da gargalhada.
Felipe Dias, que vive o pai das moças, em alguns momentos consegue empatia com o público. Já Maricota, Giulia Castro, fica muito presa a uma toalha de prato que segura durante todo o espetáculo, sem a menor necessidade. O ideal seria que a atriz buscasse outros recursos corporais para compor a interesseira personagem.
Guilherme Silvestre, no papel de Faustino, e Cristina Furtado, que vive Chiquinha, são os que têm melhor rendimento no palco: a cena em que os dois se declaram apaixonados é a mais afinada da peça.
A parte técnica do espetáculo também apresenta alguns problemas. O primeiro deles, e o mais gritante, é a iluminação, criada pela própria diretora. Além de criar pouquíssimas variações de luz durante a peça, logo nas primeiras cenas Jacqueline deixa Faustino no escuro, enquanto Maricota faz mímica da carta escrita por ele (seria melhor que ela só acompanhasse a carta com os olhos…). O cenário de Mário Pereira, um telão pintado, também não acrescenta muito ao espetáculo. Adriana Barbosa se sai melhor na criação do figurino, que, apesar de bem simples, está adequado aos personagens.
É natural que num primeiro trabalho surjam alguns problemas. Mas, para evitar que eles se repitam, talvez fosse bom a diretora procurar uma parceria com outro profissional da área, alguém com quem pudesse dividir opiniões. Apesar de todos os ajustes que precisam ser feitos, As Trapalhadas do Soldado Faustino é um espetáculo que demonstra o interesse do grupo em fazer um trabalho sério.