Cena de espetáculo Alice

Crítica publicada no Jornal do Commercio
Por Carlos Augusto Nazareth – Rio de Janeiro – 15.03.1997

 

 

Barra

Alice

As dificuldades de uma estreia tumultuada

O espaço cênico para a realização de um espetáculo é parte determinante da obra a ser encenada. A opção por palco italiano, arena, ou espaço não convencional, faz parte da concepção do diretor. Nos últimos anos o teatro itinerante, ao ar livre, passou a ser um hábito nas montagens teatrais. Quando a opção por um espetáculo ao ar livre e itinerante é absolutamente adequado amplia sua dimensão. Hobin Hood, de Gaspar Filho, transformava parte da PUC na floresta de Sherwood, e seus espectadores, no alegre bando da Floresta.

Alice tem o objetivo, na realidade, de utilizar os jardins do Parque Lage. Não é uma escolha a partir da proposta de montagem. A montagem é que serve à Proposta de utilização do Parque. Além disto, os espetáculos que provêm de cursos, e oficinas de teatro procuram colocar em cena o maior número possível de atores de forma que todos os componentes possam participar da montagem, o que mais vezes ocasiona excessos. E, no teatro, excesso é um equívoco imperdoável.

A montagem de Alice, no Parque Lage, concepção e direção de Christiane Jatahy, sofre alguns desses males. Sem invalidar a proposta, Christiane realiza, no entanto um espetáculo cujo roteiro não chega a se realizar plenamente. Num espetáculo itinerante, onde as cenas têm uma interligação absoluta, e não são quadros isolados, a condução do espectador, principalmente da criança de um espaço a outro, deve ser realizada de modo que não se perca o fio narrativo. Ou então que se opte construção quadro a quadro. As cenas esparsas e realizadas em pontos, não os mais felizes para a encenação, prejudica o entendimento e o acompanhamento da história propriamente dita. Todo o espetáculo ao ar livre realizado em Parque sofre infelizmente de problemas crônicos de visibilidade e compreensão do texto – face ao grande número de espectadores e o local de realização das cenas, permitindo, muitas vezes, que apenas o primeiro ou segundo círculo de espectadores, que rodeiam a cena, vejam, e ouçam com facilidade. Ao longo do percurso, o espetáculo vai perdendo a força e a caminhada se torna mais interessante para as crianças pela caminhada em si. Vira uma divertida gincana de quem chega primeiro ao próximo local da encenação.

Apesar de tudo, a diretora Christiane Jatahy consegue algumas cenas onde o interessante trabalho corporal desenvolvido por Laura Mariani e Renato Coelho são teatralmente significativos. Transcendem a simples habilidade acrobática. Há também cenas grandiosas, adequadas ao espaço, de grande efeito e com desenho cênico bastante criativo e funcional, utilizando efeitos na dosagem certa, sem excessos, nem virtuosismos. As acrobacias e técnicas circenses utilizadas, sob a responsabilidade de Alberto Magalhães e Juliana Vaz; são utilizadas pela diretoria de modo econômico e eficiente.

O projeto de iluminação, de Rogério Emerson, pouco interfere na narrativa, pelo espaço e pela realização diurna e ao ar livre; também pouca interferência têm a música, marionetes e teatro de sombra. Recursos que se perdem. Os figurinos de Samuel Abranches, sempre criativos, não formam, desta vez, um todo harmônico. Dos atores, Marine Bezze faz uma Alice vigorosa; a escalação de um ator para a Rainha de Copas, não empresta a magia nem a força exigida pelo personagem. A produção deve se preparar para melhor receber o público que lotava excessivamente as dependências do Parque Lage.

Alice é uma proposta interessante que fica a meio do caminho, mas que pode e deve ser revista principalmente em seu roteiro e na sua distribuição pelo espaço cênico, para que não deixe frustrado o grande número de crianças presentes. E para que o espetáculo não se reduza a um simples jogo ao ar livre, como disse um pai: Mais isto aqui é teatro ou aventura? É o próprio Indiana Jones.