Em cena: Mouhamed Harfouch (Capitão Nemo), Erom Cordeiro (Ned Land), Augusto Madeira (Conselho), Alexandre Dantas (Professor Pierre Aronax). Foto: Silvana Marques

Critica publicada no Blog Crítica Teatral
Por Ida Vicenzia – Rio de Janeiro – 12.08.2012

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Algumas Aventuras das 20.000 Léguas Submarinas

O espetáculo infanto-juvenil Algumas Aventuras da 20.000 Léguas Submarinas ficou tão interessante, que até os adultos se deliciam com ele. Texto, diretor, autor e ficha técnica se reuniram para realizar a façanha de levar Jules Verne ao palco sem as limitações de uma cena pobre. Tudo o que vemos tem amparo e substância. É o famoso teatro do “ensemble”, tão festejado pelos franceses, no qual todos os elementos da cena interagem com a mesma precisão: atores, encenadores, palco cênico, são um acerto só. E, neste sentido, o texto de Fátima Valente e a direção de Antonio Carlos Bernardes apostam em um espetáculo vivo e bem construído, desde a primeira cena, do naufrágio da fragata Abraham Lincoln, passando pelo tubarão atacando os humanos, até seu final. Neste sentido, a sucessão de cenas rápidas mantém a atenção do público.

As soluções do cenógrafo Carlos Alberto Nunes, unido ao cenotécnico Marco Souza e seus colaboradores, fazem o prodígio de revezar, em cena, os vários aposentos do Nautilus (o submarino inventado pelo Capitão Nemo), e unir a eles as visões do oceano profundo. É com puro encantamento que jovens e adultos observam as profundezas do mar, especialmente a passagem de Atlântida, a cidade encoberta, trazendo para a cena o ponto alto dessa demonstração estética “art-nouveau”, que é o espetáculo. A reprodução em miniatura do Náutilus é uma pequena joia, de Nilton Katayama.

Capitão Nemo (em carismática interpretação de Mouhamed Harfouch), como vocês devem saber, é um homem tão desiludido com a barbárie humana, que resolveu se mudar para o fundo do mar. Vai daí uma crítica que Jules Verne faz aos desmandos da humanidade, crítica essa que se ajusta a todos os tempos. Porém, Nemo é radical, e pode não ser bem compreendido pelos jovens de hoje, que ainda possuem ilusões a respeito do gênero humano. Quem não se lembra do sentimento de estranheza que tínhamos, muito jovens ainda, quando líamos sobre esse “capitão dos mares” tão desiludido com os acontecimentos na terra?
Fazendo o jogo cênico com o capitão, temos as excelentes interpretações de Alexandre Dantas, como o Professor Pierre Aronax, o estudioso que se deslumbra com os acontecimentos no Nautilus; seu assistente, Conselho (uma hilária interpretação de Augusto Madeira), e Erom Cordeiro, como o Ned Land o “arpoador da marinha americana” que, pego de surpresa nesta nova aventura, sente saudades de sua firme terra, e dos quitutes inerentes à mesma (ele já não aguenta mais comer peixe…). Marcio Malvarez é o capitão Farragut, comandante da fragata Abraham Lincoln. Ele desaparece, junto com o seu navio. Temos ainda, neste elenco de 8 atores, os soldados, interpretados por Dio Jaime, Marcos Pereira e Gabriel Bezerra, e ajudantes de cena, a caráter.

São narrados apenas alguns trechos desta obra de Jules Verne (sua viagem tomaria, com certeza, mais do que a 1 hora de duração do espetáculo). Esta é a medida necessária para manter a atenção das crianças, que permanecem absortas nos acontecimentos. Um destaque especial para Paulo Cesar Medeiros na luz, e os figurinos precisos de Kika Lopes e Masta Ariane; a música original é de Marcelo Alonso Neves, com adicional de Camille Saint Saens (o preferido de Proust, lembram?). Direção de movimento de Duda Maia. Videografismo dos irmãos Rico e Renato Vilarouca. Para quem está acostumado com o teatro infantil, mais preocupado em divertir do que desenvolver senso estético e gosto pela palavra (aliás, pela atenção com que o público jovem acompanha o espetáculo, percebemos que está mais do que em tempo de equiparar essa linguagem com a do cinema de aventura). Tal fato, o diretor Bernardes percebeu, com este Jules Verne cheio de emoções e imagens inesperadas. Um bom espetáculo, para agradar a todas as idades.

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Ida Vicenzia Flores
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro – AICT)