Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 29.04.2000
Flagrantes divertidos do Brasil
Na saga do teatro-evento, Viagem à Terra dos Papagaios é mais uma peça que se encaixa no vasto repertório desses novíssimos/dramaturgos que aportaram no teatro infantil desde o ano passado. Resolvidos a comemorar os 500 anos no palco com a jovem plateia, se depararam logo no início com um elemento complicador: o tempo urgente da nova família, que leva as crianças ao teatro e que há muito não ultrapassa os 50 minutos habituais. Assim, lá se vão os encenadores navegando rápido em rota quase desconhecida. Por incrível que pareça, o desafio tem sido cumprido com bastante competência.
Encenado no final do ano passado no Museu Histórico da Praça XV, o espetáculo de Marcos França, Viagem a Terra dos Papagaios, está agora em Fortaleza de Santa cruz. Construído em 1555, pelo governador francês Nicolau Durand de Villegagnon, o forte tem ambiente imponente, quase pesado, o que acaba influenciando a montagem. Depois de ultrapassar o trâmite burocrático do local, que envolve um guia/segurança que caminha com o público até o teatro improvisado nas arcadas em etapas e na hora mais conveniente para a segurança local, o que se assiste é quase uma réplica do teatro medieval, quando a plateia chegava ao teatro quando bem queria e saía da mesma maneira. A falta de concentração acaba interferindo no bom andamento da peça e, muito mais do que isso, no seu entendimento.
Marcos França usou para contar a sua história documentos como a carta de Caminha, a carta de Mestre João a Dom Manuel e o diário de Vasco da Gama. Com esses documentos montou um texto bem humorado e com inserções musicais divertidas, mas como quem realmente redescobriu o Brasil para atualidade foi o jornalista Eduardo Bueno, a plateia comenta feliz, ao final do espetáculo, o bom aproveitamento do texto de Bueno. Confusões normais para quem está aprendendo a história de seu país vorazmente e sem pensar nas fontes originais.
No palco, numa caravela estilizada montada pela arte do cenógrafo Sérgio Marimba, Cristine Braga e Dayse Pozzato vivem diversos personagens para compor uma história cheia de referências ao cotidiano que, dentro da nova ótica da história comportamental, vai dando entendimento à plateia do que se deixou de aprender na escola. Mas como o tempo é pouco, fica a ideia de que o melhor mesmo é seguir o roteiro e aprender mais consultando outras fontes de conhecimento. Nesse caso, o teatro que resolveu contar a história do Brasil tem sido um excelente veículo aguçador de curiosidades e esta deve ser a sua função. Dar a partida é infinitamente mais interessante do que entregar a obra pronta. E esse talvez seja o maior mérito dos novos contadores de histórias e encenadores que se entregam ao teatro-evento.
Como ninguém é de ferro, esse teatro tem que vir bem embalado para maior deleite da plateia. No caso de Viagem à Terra dos Papagaios, a trilha musical original de Marco Aureh e Marcos França, tocada ao vivo, alegre os aspirantes pesquisadores com modinhas e canções enquanto a caravela passa. Com bons ventos e nenhuma calmaria, o teatro mais uma vez faz a sua parte. O resto é com a plateia.