Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 18.04.1999
Uma divertida lição da história do Brasil
Uma nova turma de atores chega aos palcos da cidade. Desta vez, a trupe que encena, no Teatro do Museu da República, O Picadeiro da História, veio da Uni-Rio, e já apresenta um dos melhores espetáculos da atual temporada.
A ideia surgiu quando os autores – diretores André Brilhante, Renato Carrera e Perla di Maio resolveram comemorar os 500 anos do Brasil no palco. Como já estavam apresentando uma visita guiada ao centro de numismática do CCBB, foram recolhendo material para o texto. Mas o espetáculo cresceu, e uma pesquisa adicional se tornou necessária. O resultado é um incrível pocket, feito por três palhaços, que conta em pouco mais de uma hora toda a nossa história desde o descobrimento, sem nenhum tom didático. É uma vitória do humor, que enfim chega ao teatro-educação sem botar a plateia para dormir.
Tudo começa num cirquinho, que por força das atuais circunstanciais vai ter que interromper a temporada. Antes que o trem chegue, Mariola, Cuscuz e Quebra-queixo contam sua história e a da plateia, que naturalmente se confunde com a história do país. A estratégia é das melhores. Os três personagens em cena, como nas brincadeiras infantis, escolhem seus papéis. Sem tirar o nariz de palhaço, o trio vai da chegada de Cabral aos tempos atuais.
A nova história começa com uma gincana, onde índios e portugueses têm que encontrar pau-brasil, ouro, diamantes e outras riquezas. Valendo pontos, saem vitoriosos os de além-mar. Focando personagens como Zumbi dos Palmares e Tiradentes, a trama se concentra no cidadão comum e mostra a vida da mulher na colônia, quando não podia sair de casa, e depois na República, quando só podia sair acompanhada.
No período da libertação dos escravos, a princesa Isabel não chega como redentora, mas como uma mocinha que tem que obedecer a seu pai, que não querendo sofrer mais as pressões inglesas nem as dos senhores escravocratas resolve viajar e deixar a bomba estourar em mãos mais delicadas. Na guerra dos salários, a marmita de Cuscuz está sempre mais cheia de moedinhas que a de Mariola. Afinal, “Mariola é mulher, Mariola é palhaça, Mariola é gente que faz”. Nessa história divertida – e nem por isso menos real – do Brasil, as cenas vão se encaixando ao sabor das gags. Tudo é história.
A direção de Renato Carrera e Perla di Maio usa o circo como um foco na luz geral do país. Não é o clown nem o resgate da arte circense na sua mais pura essência. São os palhaços do dia-a-dia tendo que dar conta da história e da própria vida no picadeiro.
O elenco estalando de novo – e com muita vontade de representar – faz maravilhas no palco. André Brilhante (Cuscuz), Warley Goulart (Quebra-queixo) e Patrícia Garcia (Mariola) passam de uma cena a outra sem quebrar, nem deixar cair o ritmo da encenação. Ao final, depois de tanta informação, fica no ar um gostinho de quero mais. Parabéns seus palhaços.
Cotação: 3 estrelas (Ótimo)