Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 18.08.1996
Humor do bufão rouba a cena
Pedro e o Lobo, uma história recolhida no folclore russo, lançada para o mundo na versão do compositor Sergei Prokofiev feita para orquestra, onde os personagens são caracterizados por instrumentos, é um desses inexplicáveis fenômenos de bilheteria. No teatro, a história simples – Pedro e seus quatro amigos (o pato, o gato e o passarinho) conseguem capturar um lobo que vinha assustando os moradores da floresta -, usando ou não a trilha de Prokofiev para apresentar as crianças os instrumentos musicais, vem atraindo um invejável público em diversas montagens.
Pedro e o Lobo, em cartaz no Teatro dos Quatro, tem versão ampliada da obra, feita por Denise Crispun, que acrescentou ao original outros personagens como um bobo da corte, que conduz a encenação como um narrador e uma rainha bastante mal-humorada, que está na história apenas para situar o personagem do narrador. A reviravolta deste clássico da literatura infantil fez surgir em cena um show, onde o lobo comanda o espetáculo. A história principal só não vem a reboque porque, além de muito conhecida, foi mantida em sua linha principal por Denise Crispun e pela direção de Beto Brown. De qualquer maneira, estão em cena dois espetáculos diferentes. O quase monólogo do bufão e a história que dá título à peça.
O bufão é Luís Salem, um ator cheiro de recursos técnicos de comédia, que, aliado ao seu natural e especial humor, dão ao personagem empatia instantânea com a plateia. Em suas cenas, todas levemente coreografadas, e de interpretação propositadamente casual, o ator conduz o enredo, apresentando personagens, localizando cenas e até fazendo uma revisão da história para se certificar de que todos estão acompanhando a trama. Esta quebra de personagem, mas não da teatralidade, é sem dúvida nenhuma o maior trunfo da encenação.
A direção de Beto Brown, que sabiamente deixou brilhar a performance do mestre de cerimônia, teve quase o mesmo sucesso com o restante do elenco. Sérgio Hondjakoff, de apenas 11 anos é Pedro, em interpretação cuidadosa do personagem. O mesmo acontece com Gustavo Otoni, como o avô de Pedro e o caçador. Inês Cardoso, porém, é prejudicada pela complicada postura (agachada) com que interpreta a personagem Irene, a pata. André Monteiro, o passarinho Luigi, tem dificuldade de comunicação interpretando um personagem que manipula um títere e Luciano Bastos faz uma linha um pouco hard para o gato Boris. Scarlett Moon, em pequena aparição, faz um bom contraponto ao bobo da corte, no papel de rainha.
Os cenários de Afonso Tostes fecham o palco com revestimento arrojado e de efeito, que absolutamente não combinam com os adereços que compõem outras cenas que não as da floresta, como o palácio da rainha e a casa de Pedro. Os figurinos de Teça Fichinki também seguem uma linha desigual com poucos acertos. A iluminação de Maneco Quinderé e o excesso de fumaça espalhado no palco, contribuem para dar um peso desnecessário ao ambiente.
Pedro e o Lobo, além da história que atrai multidões, tem como grande atrativo o bom humor que está em cena. Os pequenos deslizes são diluídos pelas gargalhadas da plateia.
Cotação: 2 estrelas (Bom)