Crítica publicada na Tribuna da Imprensa
Por Renato Nogueira Neto – Rio de Janeiro – 16 e 17.04.1988
Flauta sem magia
O Flautista de Hamelim é um conto alemão de domínio público escrito na Idade Média provavelmente com a intensão de suavizar e explicar para as crianças o flagelo da peste bubônica que assolou o Velho – na época nem tanto – Continente.
Trata-se de uma história recheada de poesia e lirismo, a começar pela figura mágica do protagonista: um ser enigmático, amigo apenas das crianças, que livra a cidade de ratos mal vindos com as melodias inebriantes de sua flauta.
Por trás disso a sutil crítica política contida na história que vem à tona na figura das autoridades pouco inteligentes do lugar. Parece que nada mudou de lá pra cá.
A adaptação de Denise Crispun para o palco do Teatro Cândido Mendes pouco faz juz, infelizmente, à magia do conto. A montagem parece se perder no uso e abuso de truques já vistos e revistos, como citações a anúncios de televisão, a jingles, e – daí é brabo – perguntas para a participação da plateia. A peça ameaça, ameaça, mas não engrena.
Além de uma adaptação mais consistente, falta também uma direção mais nítida, apesar de serem perceptíveis em algumas marcações de movimentação e de fala dos atores alguns trejeitos da diretora Stella Miranda, uma excelente atriz.
O ator Issac Bernat compõe um flautista pouco misterioso e carismático, e ainda é o responsável pelo momento mais inusitado da peça, quando num rompante de esquisitice tira de um saco dois bonecos que ninguém sabe bem a que vieram. De todo jeito, e fora esses sustos, o elenco está à vontade, apesar da mania que alguns atores têm de procurarem ser moderninhos demais quando tentam uma certa cumplicidade com a plateia. A surpresa fica por conta da promissora Janaína Diniz que com vitalidade e talento mostra o que já aprendeu da linguagem teatral. Falando o texto com desenvoltura e intimidade.
A música de Jorge Mautner e Nelson Jacobina, a grande estrela do espetáculo, acaba soando apenas simpática, menos eficiente do que seria se a plateia conseguisse entender melhor as letras. E os figurinos de Pedro Sayad são, como sempre, cheios de humor e inteligência. Se destacam.
O espetáculo fica assim: indefinido entre a fidelidade dos figurinos ao conto alemão e as referências de texto gratuitas à realidade multimídia brasileira.
Falta mágica a esse flautista.