Raul e Ricardo (na pele dos hilários Belamenos
e Lindomais, à esq.) lutam com Isio (o rei Olígonos)

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 23.09.1995

 

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Real, ingênua e divertida

Teresa Frota é uma contadora de histórias. Mas não uma contadora comum. Qualquer enredo, mesmo os mais conhecidos – sejam eles inspirados em contos de fadas, da carochinha, ou mesmo em farsas medievais – ganham do olhar crítico da autora contornos de contemporaneidade irresistíveis. Seus personagens – sejam reis e rainhas de um país distante (A Rainha Alérgica) ou caipirões, compadres e comadres (Viravez, o Cortês) – têm conflitos muito semelhantes aos do espectador. A maquiagem de forte colorido acelera a identificação imediata com a plateia.

A Lei e o Rei é sem duvida, seu texto que mais alegoricamente usa situações do cotidiano infantil para discutir um assunto tão pertinente quanto os desmandos do poder. Num reino fictício, o rei Mássimo, pai dos príncipes Lindomais e Belamenos, se apodera do trono de Olígonos, o Nono, pai de Olinéia, a princesa mais linda da corte, e, por isso mesmo, alvo da paixão dos príncipes inimigos. Como se não bastasse esse entrevero familiar, Massimo é irmão de Anacléia, antiga paixão de Olígonos, que guarda a sete chaves um terrível segredo. O enredo, digno de uma Pelmex Filmes, não abre mão nem de uma carta extraviada, que poderia ter mudado o destino da nação.

O dramalhão mexicano, porém, chega ao palco transformado em divertida comédia. Seus personagens, mesmo envolvidos na conturbada trama da luta pela coroa, se deparam com problemas que, pelo menos uma vez por dia, são também da platéia. Massimo, segundo sua irmã, é “rei da porta pra fora” e, se deixar o banheiro molhado depois do banho, tem ele mesmo que enxugar o chão. Olígonos foge de casa para comprar figurinhas no jornaleiro e só volta se a filha lhe contar a história do Chapeuzinho Vermelho, pulando a parte em que o lobo come a vovó. As situações de real ridículo, que permeiam a ficção, são o grande trunfo dessa capa-espada doméstico.

Na direção, Henri Pagnoncelli concebe um espetáculo envolvente, mediando o brilho das atuações em favor da unidade da encenação. Com cortes exatos, a história se conta no agradável, ritmo musical, onde a trilha de Cacau Ferreira de Castro e as coreografias de Marcello Caridad, Jacyan Castilho e Raul Serrador são de surpreendente criatividade. Também muito bem-humorada, a iluminação de Aurélio de Simoni acompanha o climão, com bem-vinda interferência.

Na corte, Marcello Caridad constrói o personagem do rei Massimo, misturando o mau humor dos déspotas com a ingenuidade calculada das crianças. Um excelente contraponto para a linha infante mimado de Isio Ghelman, como Olígonos, o Nono. Também de agradável equilíbrio, as performances de Jacyan Castilho e Teresa Frota, como megeras quase domadas. Arildo Figueiredo imprime a velocidade dos quadrinhos a seu ministro Hediondo, e Ricardo Santos e Raul Serrador – os irmãos Lindomais e Belamenos – divertem a plateia com personalidades antagônicas.

A Lei e o Rei, além de tornar possível a vitória do clichê, recupera para o público infantil o prazer de se ver em cena.

Cotação: 3 estrelas (Ótimo)