Janaína Diniz Guerra e Felipe Rocha: primos apaixonados

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 17.06.1995

 

 

 

 

 

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No ritmo manso da música

A quantidade de pessoas que têm absoluta certeza de que suas vidas dariam um romance, só deve perder em número para autores que incluem em seus planos um dia escrever um texto usando como tema suas músicas favoritas. Em raríssimos casos, e a frase só é usada para não cometer nenhuma injustiça, os projetos deslancharam sem problemas.

A Bossinha Nova, texto de Karen Acioly e João Lutz, quase chega lá, porém, ainda não é dessa vez que a história de uma canção, ou a inclusão de sua letra como parte integrante de uma peça, se resolve bem no palco.

A ideia original de dois primos apaixonados (Nara e João) que só vêm nas férias, e que logo no primeiro encontro querem contar todas as novidades, mas que são proibidos de ficar conversando até tarde e solucionam o problema sonhando juntos o mesmo sonho, chega ao palco cheia de lembranças. E essa ideia é colocada no texto com rara sensibilidade.

dissonante da questão fica por conta da chegada dos primos a Terra da bossa nova, onde para algumas situações são criados ganchos, um tanto forçados para que se justifique a inclusão da música na história.

Um bom exemplo é para Lobo Bobo, de Carlos Lyra e Ronaldo Boscoli, introduzida na peça a partir de um som, supostamente um uivo, que poderia ser um lobo, onde Nara conta para João, como se lembra, tem como final, chapeuzinho de maiô, trazendo “um lobo na coleira que não janta nunca mais”.

Ainda na história, a empregada Doralice, brindada com a música do mesmo nome, de Antônio Almeida e Dorival Caymmi e o vilão Dissonante, que acaba compreensivelmente ganhando como tema, Desafinado. De Tom Jobim e Newton Mendonça, aquele que diz que “os desafinados também têm um coração”.

Se a história se mostra um tanto na linha essa música não pode ficar de fora, a direção de Karen Acioly flui suave como o som da bossa nova, e coloca no palco um casal apaixonado de namorados para Nara e João. Mesmo sem um registro vocal perfeito para interpretar as canções, ou propositalmente Desafinados, Janaína Diniz Guerra e Felipe Rocha constroem seus personagens com gestos delicados e carinhosos, que contagiam pela veracidade da interpretação.

Nas cenas de conjunto, porém, mesmo com a presença afinada de Sheila Matos e o over acting calculado de Oscar Bolão, o palco é todo de Janaína. A variedade incrível de nuances que dá a personagem, aliada ao seu natural vigor conquistam o público desde o primeiro momento.

Com cenários irregulares – na primeira parte há um desperdício de adereços, mas a segunda é plasticamente perfeita, principalmente sob a luz de Paulo César Medeiros – assinados por João Lutz e André Weller. Figurinos que não fazem justiça à criatividade até então imprimida por Ruy Côrtes a seus trabalhos. Os arranjos musicais de Tato Taborda são corretos para os 14 temas musicais apresentados no espetáculo.

A Bossinha Nova é uma encanação bem intencionada, que segue seu caminho como o ritmo que a inspirou. Mansamente.

Cotação: 2 estrelas (Bom)