Matéria publicada no Jornal O Fluminense
Por Arnaldo Moreira, Niterói, 24.01.1981
Diretor pede mais respeito para o teatro infantil
O teatro é uma das mais antigas artes da humanidade, desempenhado diferentes funções. Na Idade Média, por exemplo, ele foi usado para difusão do cristianismo e popularização do cristianismo e popularização dom Evangelho. Através do tempo, o teatro sofreu sensíveis transformações muitas delas chocantes. E hoje ele representa um favor importante no processo de desenvolvimento cultural e político dos povos, embora no Brasil ainda não se tenha encontrado a fórmula oficial para popularizá-lo, à medida que diversos fatores não favorecerem a ida do povo ao teatro.
Hoje o ator é tido como um representante da liberdade, da conscientização, da lucidez. E sua obrigação política é enorme, pois ele é um comunicador que deve envidar todos os esforços para que sua mensagem chegue ao povo, mesmo que esse povo esteja em pleno processo de crescimento físico, intelectual e cultural, e precise de peças adequadas e com uma linguagem que possa ser compreendida como uma lição comportamento para com o semelhante, como a peça infantil de David Pinheiro, Queridos Monstrinhos.
A Peça
Os meninos monstrinhos saem para passear pela floresta e chegam ao bosque branco, onde encontram uma torre na qual está encerrada a Bela Aborrecida. O Vampiro Ramiro pretende salvar a Bela e acaba se apaixonando por ela. Logo, a Bela Aborrecida corresponde ao amor do Ramiro, mas quando sabe que ele pertence a uma família inimiga da sua – a das Bruxas – conta a sua mãe Mafalda – a Fada Chata -, que faz tudo para sua filha afastar sua filha do Ramiro.
Nesse momento entra a mãe de Ramiro, a Bruxa Caxuxa, inimiga da Mafalda. Mas a Caxuxa descobre que o amor de Ramiro por Bela é muito grande e passa a apoiar o namora dos dois. Essa demonstração de compreensão comove Mafalda, que resolve fazer as pazes com Caxuxa. E assim os filhos se casam e são felizes eternamente.
“Queridos Monstrinhos é uma história de Paulo César Coutinho que, em síntese, mostra a história de duas famílias, uma de fadas, outra de monstros – as bruxas”, explicas o diretor da peça, David Pinheiro. “Dentro do consciente coletivo, os bons são sempre os anjos, as fadas. E os maus, os diabos, os monstros, as bruxas. Na peça há uma grande preocupação de acabar com essa mistificação de personagens bons e maus. Mudar essa imagem e mostrar que no mundo e existe lugar para todos, independentemente de sua natureza.”
Para David Pinheiro, o bom e o mau coexistem em cada um de nós. “O ser humano desde que passa a entender-se por gente possui a face boa e a má. E tem de conviver com ambas. Porém, muitos não conseguem e vivem em permanente conflito interior. Para que isso não aconteça, precisamos de entender a face boa e a face má e conviver com elas o melhor possível para que possamos viver em paz”, refletiu.
Teatro infantil defasado
Cada vez mais, na opinião de David Pinheiro, existe um déficit no tocante a espetáculos para crianças, “quando deveria ser ao contrário, na medida que as pessoas responsáveis ou ligadas ao setor infantil reconhecem essa defasagem. Mas parece que para elas uma coisa é falar do problema em público. Outra é fazer algo para mudar a situação. Só que ao falarem essas pessoas comprometeram-se, e isso elas não entendem”.
“Não existe ainda a conscientização para a necessidade de teatro infantil. As pessoas ainda não perceberam que a criança necessita de cultura. E popularizar o teatro é um meio que as ajudará a se prepararem”, disse David Pinheiro.
Lamentou que muitas peças em cartaz – maioria – sejam de má qualidade, visando apenas ao lucro. “Deveremos salientar que nas peças em cartaz só umas cinco se salvam. As restantes são puro comercialismo. Elas exploram personagens de enlatados americanos, como as de Walt Disney, quando existem tantas figuras na nossa história e nas histórias infantis universalmente conhecidas para serem mostradas às crianças sob os mais diversos ângulos”, citou.
Criança não escolhe
Outro problema, aponta David Pinheiro, é quanto à escolha das peças que as crianças devem assistir. “Na maioria esmagadora dos casos as crianças são levadas ao teatro sem a mínima participação na escolha da peça que vão assistir. Na verdade, quem determina a ida da criança ao teatro é o pai, ou a são os pais, nunca as crianças”, disse.
“Acho que as crianças deveriam ter acesso a esse processo de escolha através de uma rápida explicação das peças – contidas até nos próprios anúncios das peças nos jornais – e então poderiam escolher o que mais gostariam de ver. Se um espetáculo de Walt Disney, se a Bela Adormecida e os Sete Anões, ou Queridos Monstrinhos
“Esse defeito dos pais, explicou David Pinheiro, levou-me a montar um espetáculo no qual os adultos também pudessem se divertir durante a hora e meia em que estão acompanhando as crianças. Assim, introduzi a dança das sombras – uma das mais belas danças orientais – porque tinha certeza que os adultos iriam curtir”.