Embora não pudesse ser tratado na forma expressa e distinta, por dificuldades surgidas no dia para o qual estava programado, este tema operou como ideia diretriz em todo desenvolvimento do seminário, já que um criterioso respeito a importância da educação estética através do teatro determinou a colocação e em parte a solução dos problemas implicados nos restantes temas. Os pontos propostos para este tema foram:
a) a importância da educação estética para o desenvolvimento da personalidade: a educação pela arte;
b) o teatro como obra de arte e como síntese de diversas expressões artísticas: plástica, música, palavra, etc;
c) possibilidades que oferece o teatro: 1. Como espetáculo para a criança; 2. Como atividade artística realizada pela própria criança para o desenvolvimento de uma personalidade integrada;
d) a formação do gosto através do espetáculo teatral e o teatro como veículo de moralização e socialização;
O primeiro ponto proposto implica no reconhecimento de que a experiência estética é um aspecto fundamental da experiência vital humana e que a personalidade requer para o seu desenvolvimento integral, o cumprimento de tal tipo de experiência. A formação do gosto, a experiência estética em geral, não podem se dar ao acaso, e na verdade requerem um esforço educativo, uma seleção consciente daqueles estímulos que, por intermédio do belo, introduzirão paulatinamente a criança no mundo dos valores. A arte proporciona a ocasião mais pura de uma experiência estética, e nisto reside seu valor educativo. Hegel afirmou que a virtude da própria arte é poder dar das ideias mais elevadas, dos mais altos interesses do espírito, uma expressão sensível e accessível a todos. Assim, a educação pela arte não terá somente que fazer do futuro homem um esteticista, mas também é sobretudo permitir o seu acesso aqueles valores, interesses e ideias mais elevadas.
O segundo ponto situa o teatro no quadro geral das artes; o teatro é em parte complexo, é uma síntese de diversas expressões artísticas: plástica, música, movimento rítmico, palavra, ação- unidas todas elas, em geral, por uma trama ou fio argumental que é uma transposição idealizada de experiências desejos, aspirações, sonhos, angústias, frustrações,etc. Por sua capacidade de comunicação, é talvez uma forma privilegiada de arte, porque se dirige a todas as potencialidades anímicas: a sensibilidade, a imaginação, o entendimento, e porque o homem se reconhece sobretudo através da ação, em suas lutas, vitórias, fracassos, em suas transgressões e sanções, e sempre em sua relação com os outros. O teatro para crianças deve ser entendido como uma arte, acentua o caráter de ficção e de jogo, e é talvez uma das formas artísticas que oferece maiores possibilidades para o desenvolvimento de uma personalidade integrada, á qual alude o terceiro ponto. Neste sentido cabe considerá-lo em seus dois aspectos: a) como espetáculo para a criança, oferece-lhe a oportunidade de projetar-se na ação dramática, de participar por via imaginária e afetiva nos mais saudáveis princípios e nos mais elevados sentimentos da humanidade, como já o expressarmos a propósito da arte em geral, e também de lograr um possível efeito catártico com relação a certas emoções. b) como atividade realizada pela própria criança, Pensamos que deve ser entendido não como um produto a ser exibido, mas como um recurso educativo que tem por finalidade o desenvolvimento sem bloqueios dos mecanismos de expressão, seja pela linguagem ou pela ação, e favorecer a integração da criança ao obriga-la a abandonar o exclusivo ponto de vista egocêntrico e a ver a si mesma, e a ver os outros em suas relações com os demais. Tudo isso sem prejuízo da função meramente recreativa da qual todo homem, e com maior razão a criança, tem necessidade.
O quarto ponto resume as linhas gerais do tema. Na educação estética da criança o teatro há de contribuir para a moralização e integração do indivíduo, buscando lograr uma personalidade harmoniosa em seu duplo sentido: coerente consigo mesmo e em relação positiva com o meio social, disposta a prevalecer nele os valores compatíveis com a felicidade do grupo.
Se nos dizem que isto é tarefa dos educadores e não do homem é um educador em potencial – em sentido positivo ou negativo – frente uma criança, e que, portanto, quem se dedica ao teatro para crianças tem o dever inevitável de assumir não só as responsabilidades de homem de teatro, mas também as de educador.
Angelita Parodi
Professora de Filosofia, autora de inúmeros artigos e ensaios sobre a Ciência da Educação.
Obs.
Texto anteriormente publicado nos Cadernos de Teatro nº. 78, do Tablado, patrocinada pelo Serviço Nacional de Teatro – DAC – Funarte, órgão do Ministério de Educação e Cultura. Texto anteriormente extraído da Revista Duende, da Associação Uruguaia de Teatro para a Infância e Juventude. Abril de 1978. Palestra realizada durante um seminário sobre teatro infantil em setembro de 1977, em Montevidéu.