Crítica publicada no Site do CEPETIN
por Daniel Schenker (*) – Rio de Janeiro – 11.02.2008
Empenho destituído de encanto
A busca de inspiração na tradição popular nordestina, que tem norteado diversos espetáculos recentes (As Centenárias, Dom Quixote de Lugar Nenhum, Um Boêmio no Céu), desponta agora em A Fabulosa Corrida de Virgulino Lebre e Mestre Tartarugo, que acaba de desembarcar na cena infanto-juvenil transportando a fábula de La Fontaine, A Lebre e a Tartaruga, para o sertão brasileiro.
Na verdade, a programação gráfica do programa da montagem faz supor uma incorporação maior do artesanato do Nordeste do que o resultado apresentado. Seja como for, a encenação de Roberto Bürgel (que acumula as autorias de texto e música) é bem cuidada, marcada, em especial, pela aposta em variadas tonalidades de terra e no contraste entre esta “neutralidade” e as cores vibrantes utilizadas no plano do sonho de Virgulino Lebre (cenografia assinada por Carlos Alberto Nunes).
Concebida para o palco italiano no Teatro do Leblon – Sala Fernanda Montenegro, o espetáculo propõe uma relação mais direta com o espectador, desde a primeira cena, marcada pela entusiasmada entrada de Carcará, interpretado pelo ator Bruno Miguel, pelo corredor que dá acesso ao palco. No decorrer da apresentação, a diretora Lena Horn permanece investindo na quebra da fronteira entre o espaço da cena e o do público, seja ao acomodar três atores/personagens na primeira fila do teatro, seja ao ambientar a rápida e fabulosa corrida do título em meio à plateia. No entanto, estes procedimentos, talvez por soarem, em certa medida, forçados (principalmente, o primeiro), não chegam a contribuir para a construção de um envolvimento entre a montagem e o espectador.
Questões pertinentes, como a necessidade de conquistar reconhecimento e admiração e o sofrimento para superar a baixa autoestima, vêm à tona em A Fabulosa Corrida de Virgulino Lebre e Mestre Tartarugo, um espetáculo empenhado, mas carente de encanto em toda a sua realização. O elenco evidencia um esforço na composição de voz (sotaque) e gestual que nem sempre resulta de modo fluente. Mas cabe destacar a bela voz de Daniela Fontan e a expressão divertida de Édio Nunes como Mestre Tartarugo. Bem integrados ao conjunto, os músicos João Bittencourt, Roberto Kauffmann e Mingo Leahy.
(*) Mestre em teatro pela UniRio e professor de Teoria da CAL – Casa das Artes de Laranjeiras. Crítico de cinema desde 1992, publica textos no Jornal do Brasil, na Tribuna da Imprensa e colabora para a Revista Isto É/Gente e no site: www.criticos.com.br