Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 21.07.1979
Escreva a própria história
Vamos Jogar o Jogo do Jogo, de Fernando Bezerra, é uma peça que vem acumulando premiações, tanto um concurso de dramaturgia quanto nos prêmios de melhores do ano. Depois de amanhã, em São Paulo, o Prêmio Mambembe 1978 fechará seu ciclo com a entrega das premiações, e a montagem paulista de Vamos Jogar o Jogo do Jogo conseguiu vencer em algumas categorias, além de ter recebido diversas indicações. No Rio, depois de uma temporada no Teatro da Galeria, estreou semana passada, no Teatro Tereza Rachel, a versão carioca, com direção coletiva do Grupo Olhares e supervisão de Jorgeitor Melo, um dos atores.
A intenção do texto de passar estímulos criativos permanece. Frases como Vamos criar uma história, Vamos deixar as coisas acontecerem, O importante é ir, Vamos montar num raio de lua, mostram claramente disponibilidade dos personagens em percorrer caminhos novos, em não se limitar as entradas conhecidas que motivam menos a quem tem fome de explorar o mundo. Ao final, quando se percebe o que é o livro, aí então a ideia do autor se completa mostrando que o futuro está aí – em branco – e que depende de cada um escrever a sua própria história. Ela poderá ser absolutamente individualista; poderá ter senso comunitário; poderá ser uma história viva e criativa; poderá ser apenas banal; poderá ser escrita pelo indivíduo; ou o indivíduo deixará passivamente que escrevam por ele.
Da mesma forma, a montagem poderia ser viva e criativa ou simplesmente banal. No caso da peça em cartaz no Tereza Rachel, ficamos mais próximos da segunda hipótese. Falta um toque de brilho por parte da direção. O espetáculo é muito morno, a narrativa não tem ousadia e a encenação só se afasta da rotina com a interpretação de Iolanda Melo, realmente muito engraçada, comunicativa e que atrai a atenção. Falta ao espetáculo também mais expressividade visual. Não há, por exemplo, qualquer unidade entre a casa e a cerca (aliás, qual a necessidade daquela casa?).
Os atores mostram um positivo jeito descontraído, mas que carece de impulso, de energia, de comunicação. Fica a impressão de que se comunicam bem entre eles; mas essa comunicação fica apenas no palco; não ultrapassa o proscênio, não chega ao público. A música de Carlos Henrique Veiga e de Fernando Bezerra é bonita isoladamente e talvez funcione numa outra concepção de montagem. Nesta encenação ela acaba contribuindo com a atmosfera neutra e rotineira.
Salvo erro, essa é a primeira produção do Grupo Olhares. Existe como crédito, a intenção e a capacidade de selecionar textos que sejam vivos; mas falta ainda o domínio da linguagem. Direção coletiva dificilmente dá bons resultados, principalmente com elementos pouco experientes. Que tal continuar selecionando bons textos e convidar um diretor?
Apesar de todas as ressalvas, a encenação é perfeitamente assistível. Os pais, levando seus filhos, certamente sairão recompensados. Mas essa recompensa poderia ser bem maior.