Louise Cardoso

Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 18.03.1978

Os Cigarras e os Formigas: só dois dias

Os Cigarras e Os Formigas, de Maria Clara Machado, poderá ser visto hoje, em sua versão paulista, no Teatro Municipal de Niterói, às 16 horas, e amanhã, no Teatro Dulcina, às dez da manhã. A direção do espetáculo paulista é também de Wolf Maya, que realizou na versão original carioca estreada na Casa Grande, no início do ano passado, um dos melhores espetáculos do ano.

Apesar de ser uma encenação preocupada com vários níveis de leitura, para perfeita apreensão tanto por parte dos menores quanto dos adolescentes, é visível que o texto de Maria Clara Machado e a montagem de Wolf Maya têm uma comunicação mais ampla com a faixa de crianças maiores. Utilizando seu humor de forte carga crítica Maria Clara fala de adolescentes, de namoros, de vestibular, de festas. E, principalmente, fala das posições cigarras e das posições formigas com que os adolescentes têm que se relacionar cada vez mais no seu cotidiano – já que esse é um período em que ampliam sua faixa de contatos com o mundo.

O que se coloca, essencialmente, é o conflito entre duas posições de vida. A posição formiga, caracterizada pelo fechamento, com o ser humano avesso ao mistério e às descobertas, sempre mais preocupado com a segurança do que com a liberdade, sempre mais interessado em viver sem riscos do que em viver em plena autenticidade. A posição cigarra, contrária, é aquela que percebe na criança (em especial) e no ser humano, em geral, uma individualidade, uma alegria de viver, uma consciência crítica. Maria Clara utiliza uma família fechada – os Formigas – e uma família aberta – os Cigarras – (além da família Batista, também cheia de preconceitos) para discutir abertura versus fechamento, para questionar falsos conceitos “positivos” sobre a vida, liberdade, acomodação, bom comportamento, estudo, ludismo.

O espetáculo criado por Wolf Maya é muito comunicativo, alegre, e se utiliza eficientemente do elemento musical (a trilha sonora de Luís Carlos Simas também foi dirigida para o gosto das crianças maiores). O elenco, muito seguro, mantém a base da versão carioca; Louise Cardoso, Sebastião Lemos, Vera Setta, Lauro del Corona, Denise Dumont, Diogo Vilela. Os cenários e figurinos de Acácio Gonçalves também permaneceram no espetáculo paulista, auxiliando o que os autores chamam de “musical satírico”.

Com Os Cigarras e os Formigas chega ao fim o Projeto Mambembinho. Que o público não se esqueça, hoje e amanhã, que esta é a última chance de ver bons espetáculos ao preço de CR$ 10. E deve ser, também, a última chance de ver esta boa encenação, que conseguiu apontar quatro elementos como finalistas do Prêmio Mambembe, cujo resultado será brevemente: Maria Clara Machado, Wolf Maya, Vera Setta e Acácio Gonçalves.

Eis um bom programa para este fim de semana. E quem quiser dar uma esticada até Petrópolis terá a chance de apreciar os últimos dias do Festival Brasileiro de Teatro de Bonecos.