Fabíola Fracarolli e Francisco Hosanã vivem uma nova concepção (de Rubem Rocha Filho) para o clássico Romeu e Julieta, sob a direção de Sérgio Brito: agora, tudo cantado, dançado e para consumo infantil.

Matéria públicada no Jornal do Brasil
Por Yan Michalski – Rio de Janeiro –  09.11.1970

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Barra

Chega de Fadas e Coelhinhos

Um promissor esforço no sentido de reformular os conceitos convencionais – e, na maioria das vezes, amplamente insatisfatórios – de teatro para crianças está sendo mostrado desde ontem no Teatro Ipanema, através de uma adaptação livre de Romeu e Julieta, que Rubem Rocha Filho, autor de várias peças para crianças, transformou numa comédia musical infantil.

A Banda Antiqua está na sala de espera com seus instrumentos medievais, conversando descontraidamente com a garotada. Explicam o que é a flauta doce, de onde vem o alaúde, como se toca o kruhorn, e levam as crianças para dentro do teatro, quando o espetáculo começa: “Nós somos os jovens de Verona/ Nós vimos como tudo se passou/ Vocês aqui nem podem imaginar / O que sofreu um casal que se amou…

Quem descreve o início do espetáculo é o seu jovem produtor, Sérgio de Lima e Silva, que está à frente do movimento que se inicia com Romeu e Julieta, e cujas próximas etapas já estão sendo programadas: Isabel Camara, a autora de As Moças, prepara uma adaptação infantil do musical Lili, e para o ano que vem está prevista uma Joana D’Arc para crianças, adaptada por Rubem Rocha Filho.

Partimos da ideia de que a criança precisa em primeiro lugar gostar do teatro, sentir gosto em participar do espetáculo, e prestar atenção ao que diz o ator. Então, devemos dar um outro sentido ao teatro infantil. O divertimento complementa um texto sério, uma produção bem cuidada e um elenco selecionado. Porque a criança não quer mais ser enganada com fadas e coelhinhos que a ela nada mais dizem. E a televisão mostra-lhe a imagem da violência nos desenhos animados, ou então – o que é pior – as deturpadoras telenovelas que têm um índice enorme de audiência infantil.

Começamos com Romeu e Julieta uma série de espetáculos infantis, pretendendo realmente despertar o interesse da criança pelo teatro. Por isso partimos de um texto, onde a comédia se mistura com lirismo e vai direto à sensibilidade do mundo infantil.

A direção sublinha este texto e cria identificações com a plateia.

E toda uma época é trazida de volta, misturada ao nosso tempo, dizendo a grande verdade de Romeu e Julieta: o amor vence sempre. Por tudo isso, pretendemos que os pais recebam na porta um cartão dizendo: “O importante é sentar, ver e ouvir. Ensine à criança que no teatro se deve ver e ouvir, para que ela compreenda a história e sinta prazer em estar no teatro. O importante é sentar, ver e ouvir”.

Uma Comédia Dell’Arte

A seriedade das preocupações artísticas do movimento pode ser medida pela decisão de entregar a direção de Romeu e Julieta a um profissional experimentadíssimo e competente como Sérgio Britto. Eis o que ele tem a dizer sobre o seu trabalho na direção de Romeu e Julieta:

Romeu e Julieta não tem nada a ver com a peça de Shakespeare a não ser como musa inspiradora. Rubem Rocha Filho recebeu de Sérgio de Lima e Silva a encomenda para escrever uma peça que trouxesse até a criança o mito de Romeu e Julieta.

O nosso Romeu e Julieta além de trazer este mito, sem as implicações das dificuldades finais do casal, é um espetáculo que visa a excitar o interesse infantil através de elementos um pouco novos. Todo espetáculo infantil hoje em dia tem música e dança, mas o nosso é todo dançado e cantado. E, quando não o é, a música e a dança são substituídas por uma mímica bastante ilustrativa. A marcação do espetáculo é propositalmente geométrica, e muitas vezes surgem marcações de boca de cena, como na ópera ou na commedia dell’arte.

Nos personagens da comédia de Rubem Rocha Filho podem ser encontradas associações com personagens clássicos da commedia dell’arte. Por exemplo, o pai de Julieta no fundo é um Pantaleão, a ama tem um resto da colombina que ela foi na juventude, Mercúrio pelo seu temperamento apresenta um espírito algo parecido com o de Arlequim, Manu é o criado imbecil de todas as comédias clássicas. Romeu e Julieta, vistos dentro de um espetáculo infantil, perdem evidentemente um pouco da sua grandeza dramática. Julieta é uma menina e Romeu um menino que ainda vão à escola. No diálogo inicial, ela pergunta a ele: “Você já fez a lição de casa?” “Você vai à praça domingo?”. Julieta é como toda menina que começa a namorar, ela é o símbolo das meninas dessa idade.

Eu acho muito sadio encontrar nos dias de hoje este símbolo no teatro infantil, porque a criança ouve falar em amor puro.

Ela já escuta falar, no cinema e principalmente na novela de televisão, de um amor que às vezes não é tão puro. Daí é bom restituir à criança a possibilidade de um amor que é limpo, meio infantil, ainda meio ligado a ela.

Quem é Quem em Verona

O espetáculo dirigido por Sérgio Brito tem cenários e figurinos de Paulo Bandeira, e a coreografia foi criada por Gilberto Mota. Fabíola Fracarolli e Francisco Hosanã, respectivamente como Romeu e Julieta desempenham os dois papéis que constituem o sonho de todos os jovens intérpretes. Estão também no elenco: Nei Latorraca, Páris; Luís Armando Queirós, Julião; Diana Antonaz, Ama; Nice Rissone, Romana; José Steinberg, frei Lourenço; e Mário Abrantes, Manu. Os integrantes da Banda Antiqua interpretam os jovens de Verona, além de se responsabilizarem por toda a importante parte musical da realização. Marie-Louise Néri confeccionou para Romeu e Julieta mais um dos seus espetaculares cavalos.

O espetáculo está sendo apresentado no Teatro Ipanema todos os sábados e domingos, às 15h30m.Segunda feira, dia 16 de novembro, haverá uma sessão noturna especial para imprensa e convidados.