Crítica publicada no Jornal do Brasi
Por Ana Maria Machado – Rio de Janeiro – 01.05.1976
No Sopro dos Ventos, a Beleza Eterna dos Lenços
A temporada de teatro infantil carioca está atualmente dominada pela remontagem de História de Lenços e Ventos, de Ilo Krugli, que as crianças já viram há dois anos. É uma excelente oportunidade de rever um belíssimo espetáculo – todos sabem como criança adora repetir aquilo de que gosta. E quem não assistiu ainda vai poder agora entender porque a peça se transformou num marco de nosso teatro. Desta vez, no palco italiano do Gláucio Gil, se a montagem perde a festiva informalidade e o intimismo com a plateia que a acompanhavam na Sala Corpo/Som do MAM, em compensação ganha uma certa solenidade e rende muito mais em termos de aproveitamento de recursos de iluminação. O trabalho de som está ainda mais elaborado, cheio de pequenos toques sutis e criativos que só engrandecem o espetáculo. Em cena, um número maior de lenços acentua a atmosfera feérica.
Pessoalmente, já vi esse espetáculo cinco vezes, em palcos diferentes de diferentes cidades – não só ele se mantém sempre um dos momentos mais comoventes de minha experiência de espectadora, mas a cada vez descubro novas coisas. Agora, com a participação da plateia, foi a descoberta da fina destruição do maniqueísmo, ao ouvir um menininho propor que o herói-papel renascido não seja só mais forte, mas também um pouco ruim, para poder enfrentar o poder do vilão em melhores condições. Pouco depois, o destaque dado à fraqueza e coragem do mini soldado do Exército de Rei Metal Mau acentua a perene humanidade de qualquer um, independente do lado em que estiver. A história é excelente. Os recursos teatrais são empregados com uma generosidade e uma inventiva raramente vistas: teatro de bonecos, de sombras, aproveitamento de objetos quotidianos e materiais diversos, lembranças de festivais populares chineses no desfile do dragão, e um integral trabalho de atores. Um espetáculo que dignifica a criança e o teatro.
Merecem ainda ser recomendados: Andar Sem Parar de Transformar, um belo espetáculo ao alcance dos bem pequeninos; Viagem Sideral, sobretudo pelo texto, atraente aos maiores; O Dragão, para pré-adolescentes. E o circo continua sua temporada.