Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 28.10.1975

Barra de Divisão - 45 cm

O trem supermãe

-“A senhora censura meus ouvidos, mas meus olhos enxergam, mãe.”

A supermãe Leopoldina é antiquada, tem uma visão limitada sobre educação dos filhos, é bastante rígida: “Mãe locomotiva é mãe de ferro / Filho é para a mãe tomar conta”. Ela procura educar seu filho protegendo-o do mundo, ensinando-lhe conceitos decorados, em vez de estimulá-lo a se expor perante cada experiência nova que surja. Seu filho – Zé Vagão da Roda Fina – sofre com isso, mas não tem forças para modificar a estrutura. O surgimento da Bruxa Jubilosa significa, para Zé Vagão, a possibilidade de contar com uma cúmplice, na sua tentativa de viver mais plenamente, Jubilosa é uma bruxa meio às avessas e, tem, como objetivo a defesa dos sábados, domingos e da roda-gigante. Ou, se quisermos continuar na linguagem específica dos trens; Jubilosa quer tirar Leopoldina e Zé Vagão de seus trilhos, definitivos, que levam sempre aos mesmos lugares. Porém, o apelo mágico de liberdade mantém-se num nível apenas episódico; impõe-se a realidade concreta do cotidiano; Zé Vagão adulto e pai, comporta-se de modo repressor e castrante com seu filho “que tem a roda fina, pois não come vitamina”.

Agora, que já foram realizados alguns cortes no espetáculo, a encenação corre bem. Tem força visual e bom acabamento. Entretanto, no que se refere às marcas e movimentos, a montagem é decepcionantemente pobre; os atores repetem-se muito. Sylvia Orthof não conseguiu vencer a barreira do pouco espaço. O espetáculo, que conta com cenas muito expressivas e envolventes, como a da bruxaria, certamente obteria maior eficácia se houvesse mais rendimento na parte sonora. Os atores, além de cantarem para dentro, ressentem-se de garra, nestes momentos. O mesmo pode ser dito quanto ao início da peça, na hora das apresentações; falta vida.

Os atores estão firmes, formam um elenco homogêneo e, aí, talvez esteja o maior mérito da direção de Sylvia Orthof, Lais Dória (Jubilosa), Ge Orthof (Zé Vagão) e Ingrid Vorsatz (Leopoldina) obtém um bom grau de comunicabilidade e clareza. Lais e Ingrid devem se preocupar com a expressão corporal: nem sempre o corpo esta dizendo a mesma coisa que o texto. Ingrid começa um tanto vacilante, mas firma-se logo com o correr do espetáculo; Ge tem um bom trabalho de ritmo e de inflexões, mas sua interpretação chega um pouco ao exagero; e Lais – auxiliada pelo personagem e por um sorriso muito comunicativo – consegue criar sempre, em torno de si, uma aura de constante interesse.

Zé Vagão, da Roda Fina e sua Mãe Leopoldina, no Teatro SENAC, é uma montagem bonita, inteligente, com belas músicas, expressivos figurinos e que diverte muito as crianças pelo encantamento de Jubilosa e dos trens.

Recomendações:

A Margarida Curiosa Visita a Floresta Negra, na Casa Grande; Papo de Anjo, no Gláucio Gill; Da Metade do Caminho ao País do Último Círculo, no Gláucio Gill; Bingo, no Miguel Lemos; Zé Vagão da Roda Fina e sua Mãe Leopoldina, no SENAC; Estória da Moça Preguiçosa, no MAM.