O Anjo Gabriel preso no satélite

Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 19.10.1975

Papo de Anjo

Papo de Anjo, foi o texto que ficou em terceiro lugar no Concurso de Peças do Serviço Nacional de Teatro do ano passado. De um modo geral, a peça é boa, corre bem, desenvolve-se com interesse. Mas existem algumas falhas estruturais que merecem ser citadas:

1ª) Para que a peça possa se desenvolver os personagens adotam atitudes incoerentes. Por exemplo: ao invés de colocarem logo o Anjo Gabriel para receber a descarga do Sentitec, os cientistas preferem “deixar para amanhã”. Sem qualquer motivação lógica;

2ª) Não havia qualquer necessidade de fazer uma demonstração da máquina ao Anjo, para que ele concordasse em entrar nela. O Anjo era prisioneiro, entraria na máquina de qualquer forma, por bem ou à força.

3ª) O cientista percebe que trocaram os tubos da máquina (detalhe pouco perceptível) e não vê que o prisioneiro está sem mordaça (fato que se nota logo-logo).

A montagem (direção do autor: Ricardo Mack Filgueiras) é muito bem cuidada e tem seus pontos altos na coreografia de Ernestina Mack Filgueiras e no cenário (criação do grupo). As crianças vibram com todo o aparato do laboratório, com as luzes que apagam e acendem, com a orelha eletrônica, com o supercomputador. Entretanto, a direção do espetáculo falha quando se trata da unidade do elenco. Há um desnível demasiadamente grande entre o trabalho dos cientistas e dos demais. Enquanto os primeiros trazem vida à encenação, com segurança e brilho interpretativos, os anjos e os meninos titubeiam, demonstram grande inexperiência de palco. Em síntese: quando os cientistas estão em cena, o espetáculo sobe e corre com desenvoltura. E vice-versa.

Papo de Anjo, de Ricardo Mack Filgueiras, é uma montagem onde os pais podem levar os filhos com a certeza de que a produção é bem cuidada, que não se ensina bobagem as crianças e que a parafernália científica do cenário será curtida intensamente. As falhas apontadas não invalidam o valor global do trabalho.

Recomendações:

Da Metade do Caminho ao País do Último Círculo, às 18h, no Gláucio Gill; Papo de Anjo, às 16h, no Gláucio Gill; Zé Vagão da Roda Fina e sua Mãe Leopoldina, no SENAC; Estória da Moça Preguiçosa, no MAM; A Margarida Curiosa Visita a Floresta Negra, na Casa Grande; Bingo, no Miguel Lemos.