Crítica publicada em O Globo – Rio Show
Por Mànya Millen – Rio de Janeiro – 12.10.1996
Esconde-Esconde: Texto de Martins Penna renova o fôlego da Cia. Dramática
Uma Farsa genuinamente brasileira
Investir numa unidade cênica e dramatúrgica que funcione como um cartão de visitas é um privilégio possível apenas às companhias dotadas de corpo estável, do diretor ao figurinista. Criada há apenas dois anos, a Cia. Dramática de Comédia é uma destas privilegiadas e consegue manter em Esconde-Esconde, o seu terceiro espetáculo, a mesma concepção de A Incrível História do Homem que Bebia Xixi, primeira peça da companhia.
Entretanto, diferentemente desta e de Volpone, ambas baseadas em textos estrangeiros (a primeira em Molière, e a segunda no inglês Bem Johnson), Esconde – esconde foi encenada a partir de um êxito de Martins Penna que, no século passado, derramou seu olhar crítico e sua língua ferina sobre a sociedade carioca. A troca foi o suficiente para que esta produção dê um salto qualitativo em relação às anteriores.
Embora mantendo a mesma tradição da pesquisa sobre a linguagem da commedia dell’arte, o diretor João Batista pareceu mais a vontade para encenar uma farsa genuinamente nacional. O resultado aparece, principalmente, na melhoria do ritmo do espetáculo, principal entrave nas duas peças anteriores. Ponto para o diretor.
A história é relativamente simples, embora cheia de malícias. No Rio de 1840, vive o cabo José Pimenta (Eduardo Salinas) com suas duas filhas: a namoradeira Maricota (Giselda Mauler) e a tímida Chiquinha (Sônia Praça), que disputam a atenção de Faustino (Eduardo Rieche). Este, por sua vez, sofre com a perseguição do Capitão Ambrósio (Roberto Guimarães), também interessado em Maricota.
Entre negociatas e pequenas traições amorosas, o jogo de erros proporcionado pelo texto de Martins Penna é um excelente veículo para interpretação dos atores. E, no elenco, até pela riqueza dos personagens, Giselda Mauler e Eduardo Rieche são os grandes destaques.
Visualmente, o espetáculo traz novamente a assinatura de Dóris Rollemberg no cenário eficiente e criativo – armado na arena circular do Teatro do Planetário da Gávea, onde a peça fica em cartaz até amanhã – e do premiado Mauro Leite nos belos e coloridíssimos figurinos, outra marca registrada do grupo. A trilha sonora que inclui algumas músicas de época complementam com precisão esta boa diversão.