Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 10.06.1975
A Gatinha Detetive
Existe uma profunda diferença entre um espetáculo que deseja passar, como informação, a ideia de que a decadência e a morte se apossaram de um circo e entre uma encenação que se caracteriza por uma montagem sem brilho, com os atores sem expressividade, com total ausência de clima. O desejo de comunicar a ideia de alguma coisa morta não pode ser confundido com a criação de um espetáculo morto, artisticamente falando.
Mas o que acontece com a montagem de A Gatinha Detetive é exatamente isso: da feiura do cenário de plástico ao trabalho sem vitalidade do diretor – passando pela inexpressividade do elenco – tudo transmite um tom morto, de total inutilidade. Fica claro, a todo instante, que esse não é um grupo formado por picaretas com o objetivo de ganhar dinheiro; mas fica claro, também, que existe uma longa distância a ser percorrida entre o trabalho de pessoas carregadas de ótimas intenções e uma verdadeira obra de arte.
Porém, mesmo que o diretor Claudiomar Carvalhal tivesse encontrado a chave do espetáculo, ainda assim a encenação permaneceria insossa devido à fragilidade do texto de Lúcio Gentil. O processo de desenvolvimento da peça baseia-se no esquemático entra-e-sai dos personagens: estão em cena a Gatinha, a Bailarina e a Domadora; acabam de conversar, saem de cena. Aí, entra o Palhaço, diz seu texto e sai; entra o dono do circo, lança sua fala e sai; entra o mágico etc. etc. etc. Além do mais, gasta-se muito tempo para dizer muito pouca coisa: a peça vai e volta e, ao final do primeiro ato, por exemplo, as informações transmitidas ao público são praticamente as mesmas que as do início da peça. O texto também falha como “policial”: desde o início todos sabem que é o culpado. E, para complementar, ao final de vários minutos de gratuidade, algumas mensagens para a indefesa plateia: “Estudem muito, criançada”. (SIC); “Você não sabe que não se deve pregar susto nos outros?”, “Não sabe que não se deve fazer o mal?”…
A direção cai junto com o texto. O espetáculo também é redundante, repete-se, visualmente, o entra-e-sai dos personagens não é resolvido, e há sempre buracos. E principalmente, à direção faltavam vida e ritmo.
O elenco transmite uma sensação de profundo desinteresse. Parece que nenhum dos atores está interpretando com prazer, parece que ninguém gosta do que está fazendo, nenhum deles curte o espetáculo. Além do mais os atores erram constantemente no português (plurais e concordâncias) e isso é um detalhe ainda mais importante se considerarmos que a peça se dirige a crianças. Os figurinos são muito desiguais, juntando num mesmo bolo a interessante roupa da Gatinha e os tristes capuzes dos fantasmas. E o responsável pelo cenário (quem é) caiu na mesma armadilha do diretor ao procurar um tom de decadência.
Recomendações:
Você Tem um Caleidoscópio?, no Teatro Nacional de Comédias: último dia, Pluft, no Tablado; Criançando, na Casa Grande; A Viagem de Barquinho, no MAM