As veteranas Walderez de Barros e Vera Mancini

Brian e Clara: os jovens do grupo

Critica publicada no Jornal da Tarde
Por Alberto Guzik – São Paulo – 09.08.1989

 

 

 

 

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A nova montagem do Grupo Tapa contagia o espectador
A montagem de Nossa Cidade, de Thornton Wilder, pelo Tapa, flui macia e desenvolta

O encontro do grupo Tapa com Nossa Cidade, de Thornton Wilder, marca mais um passo importante no crescimento e amadurecimento dessa equipe ímpar, cuja trajetória a cidade tem o privilégio de acompanhar há três anos. Num processo muito particular de trabalho, o Tapa vem conseguindo viabilizar um repertório consistente. Nele alinham-se sólidos exemplares da melhor dramaturgia, como O Tempo e os Conways, de J.B. Priestley, Perdoa-me por me Traíres, de Nelson Rodrigues, Solness, o Construtor, de Henrik Ibsen. Com Nossa Cidade, patrocinado pelo projeto Arte em Cena, da Caixa Econômica Estadual, o Grupo Tapa impõe-se mais uma vez como cuidadoso e criterioso realizador.

O dramaturgo Thornton Wilder atuou num dos períodos de ouro do teatro americano deste século, a década de 30, e não se caracterizou por prolífica produção. Mas seus textos, sem exceção, acabaram marcando e impondo-se no repertório mundial. É o caso de A Casamenteira, que se transformou no musical Alô, Dolly! E de Por um triz, curiosa antecipação do teatro do absurdo. Nossa Cidade levou para o teatro dos Estados Unidos procedimentos emprestados ao espetáculo épico, criado por Erwin Piscator, na Alemanha (a fórmula atrairia, mais ou menos na mesma época, a atenção de Bertolt Brecht). Nossa Cidade estreou em 1938, tornando-se quase instantaneamente um clássico em sua terra.

A trama é conduzida por um Diretor de Cena, espécie de meneur-du-jeu que entrelaça os vários episódios. Ao mesmo tempo em que se forma um painel de uma cidadezinha dos Estados Unidos no início do século, é apresentado também o destino de uma jovem, Emília. Essa leva vida comum de adolescente e jovem esposa até morrer, aos 26 anos, no parto do segundo filho. Das pequenas alegrias e tristezas da comunidade até uma delicada reflexão sobre a vida e a morte, a peça arma-se como tocante depoimento sobre gente anônima, que leva um cotidiano de rotina, sem compreender o alcance da aventura humana a não ser quando é demasiado tarde.

Eduardo Tolentino de Araújo, encenador de Nossa Cidade, transpôs a ação da peça para o Brasil do início do século, transformando Groover´s Corner, a aldeia de Thornton Wilder, em Pires Camargo, cidadezinha do interior de São Paulo. O procedimento contribui para aproximar de nós o mundo das personagens e deverá mostrar grande eficácia quando Nossa Cidade iniciar sua excursão por 35 cidades do hinterland paulista em setembro. A montagem do Grupo Tapa flui macia e desenvolta. O espetáculo foi concebido com criativa sobriedade, conseguindo excelentes resultados, intensa e contagiante teatralidade.

Os figurinos de Lola Tolentino e a iluminação de Wagner Freire são elementos fundamentais no projeto da direção de Nossa Cidade. Contribuem para configurar com perfeição a moldura de época que enquadra o espetáculo. O desenho de cena concebido por Eduardo Tolentino reforça os valores humanos do texto, transmitindo para o espectador a sensação de maravilhamento e espanto que permeia os atos das personagens. Importante também nesse quadro é a direção musical de Gustavo Kurlat. Eduardo Tolentino tem extrema sensibilidade para perceber o que há de característico no universo de cada autor que monta. Domina a linguagem da encenação e sabe como transformar o estilo do dramaturgo em matéria teatral da melhor qualidade. Nossa Cidade é mais uma prova de seu talento.

O elenco reunido pelo Grupo Tapa para essa montagem é extraordinariamente homogêneo em seu rendimento. Dos jovens Clara Carvalho e Brian Penido aos veteranos Walderez de Barros, Umberto Magnani, Mario César Camargo, Vera Mancini e Maria Pompeu, os 18 atores que integram a montagem mostram total afinação com o projeto do espetáculo e desenvolvem trabalhos convincentes, aliciantes. Em Nossa Cidade convivem com excelentes resultados três gerações de intérpretes. O novo espetáculo do Grupo Tapa é um exercício de seriedade, dignidade e amor ao teatro. Não podia dar noutra coisa: contagia o espectador.

Serviço
Nossa Cidade, de Thornton Wilder. Direção de Eduardo Tolentino de Araújo. Com Clara Carvalho, Brian Penido, Walderez de Barros, Umberto Magnani, vera Mancini, Mario César Camargo e outros. Teatro Sesc-Anchieta (r. Dr. Vila Nova, 245. Tel: 256-2281). De quarta a sexta, 21h; sábado, 20 e 22h30; domingo, 19h. NCz$ 10,00