Crítica publicada no Jornal do Brasil
por Carlos Augusto Nazareth – Rio de Janeiro – 26.03.2006
Encantamentos
Gaúchos encenam a magia dos contos de Andersen
Encantadores de Histórias é um dos três espetáculos que a companhia gaúcha Caixa do Elefante Teatro de Bonecos traz para o Teatro do Jockey, na Gávea, dentro das comemorações de seus 15 anos de trabalho. Trata-se de uma tríade diversificada em que cada montagem privilegia uma técnica diferenciada. Mas em toda a qualidade, o cuidado e a precisão são características marcantes.
O Cavaleiro da Mão-de-Fogo tem como técnica-base o teatro de sombra; Histórias da Carrocinha utiliza a tradicional técnica de manipulação de luvas. Encantadores de Histórias mescla a narrativa oral cênica, com o teatro de animação, adaptando dois dos contos mais conhecidos do dinamarquês Hans Christian Andersen, O Soldadinho de Chumbo e Tudo está bem quando acaba bem. Isso é feito em forma de versos, numa adaptação assinada por Paulo Balardim e Carolina Garcia, que respondem também pela concepção do espetáculo. A direção musical e preparação vocal são de Christiano Hanssen.
A cenografia, também de Paulo Balardim, é criativa e de uma delicadeza ímpar. Em um triciclo entram em cena os atores munidos de uma pequena bateria musical. Ali, no veículo, estão os adereços, bonecos e os próprios atores, Paulo Balardim e Carolina Garcia, que cantam e contam as histórias de Andersen.
No próprio veículo se abrem pequenos compartimentos de onde surgem bonecos que os atores manipulam. Surgem também a lareira, onde se queimam a bailarina e o soldadinho de chumbo, enfim, todos os elementos que os atores utilizam durante o espetáculo, transformando o veículos numa caixinha de surpresas.
Os figurinos, de Maira Coelho, merecem um destaque especial. Inspirada nos costumes tradicionais gaúchos, a figurinista recria peças universais, sem deixar de lado o toque regional. Aparentemente simples, mas cheias de detalhes, as vestimentas são um elemento significativo dentro do espetáculo.
Nesse poético veículo, os atores passeiam por entre o público, convidando todos a ouvir os fantásticos contos de Andersen. Em meio aos brinquedos de um menino, um valente soldadinho de chumbo, perneta, enfrenta inúmeras aventuras, movido pelo incondicional amor a uma pequena bailarina de papel.
No outro conto, um casal de velhos campesinos decide trocar seu cavalo por algo de maior valor. De troca em troca, um cobrador de impostos e apostadores vão tentando sempre obter vantagens em suas trocas. O espetáculo segue a linha dos contadores de histórias que se utilizam da música, dos bonecos para bem se desincumbirem de sua tarefa.
Porém, o tom dos atores ainda é muito mais próximo do narrador – que tem uma postura absolutamente diferenciada daquela do contador – , que busca o coloquialismo, a proximidade entre eles e a plateia. Trata-se de mais uma experiência dentro da tendência que toma agora frequentemente não só o teatro para crianças, mas o teatro adulto: narrar com teatralidade, mantendo o coloquialismo e a informalidade, mas se utilizando de todos os aparatos que o teatro coloca à disposição.
A considerar, apenas o fato de que os versos dificultam a intimidade entre os contadores e plateia mirim.