Crítica publicada no Jornal do Brasil
por Carlos Augusto Nazareth – Rio de Janeiro – 01.07.2006
Não basta pôr nariz vermelho e levar tombo para ser clown
Com um Pé no Rio – Goiaba e Chiquinho é um espetáculo de clowns que está em cartaz no Teatro Cândido Mendes, em Ipanema. A concepção e direção são de Surian Barone, que faz o palhaço Goiaba ao lado de Marcelo Correa, que interpreta o Chiquinho do título. No palco apenas um halteres mal construído, que se desmantela serve de cenário à encenação, que não passa de uma série de ações inconsequentes. A única explicação para a montagem seria extratexto: os atores vêm de Curitiba.
A linguagem dos clowns é requintada e sutil, de difícil execução, já que trabalha num ritmo próprio e com função critica, além de pressupor uma história. Costuma encantar a plateia pelo inusitado e o domínio absoluto de várias linguagens. Por tanto, não se trata simplesmente de colocar um nariz vermelho, fazer caretas, dar pulos e levar tombos no palco.
Os dois atores não têm domínio da técnica – apenas caras e bocas comentam as ações em cena. Um roteiro, sem palavras, como o do espetáculo, tem que ter um subtexto que sustente as peripécias e dê lógica e coerência. Mas ali parece que a palavra de ordem é fazer qualquer coisa para distrair as crianças, no pior sentido da expressão.
Os figurinos, sem nenhuma proposta estética, se aliam a objetos cênicos expostos exatamente como vieram da loja, sem tratamento plástico. A trilha sonora não dialoga com a cena, funciona meramente como música-ambiente. A luz clareia o palco e mais nada.
Em artigo dos anos 80 sobre como fazer teatro infantil, onde critica aqueles que o tratam como algo menor, mais fácil, Jorge Garoya já dizia que as crianças não perdoam. “Quando elas se tornam adultas e vão ao teatro, depois de muito tempo sem ali pisar, ninguém alega haver uma desculturização teatral originada na infância em virtude do que presenciaram. Então se reconciliam com uma das mais belas artes e se dão conta de seu passado de plateia sofredora – vaiam em silêncio e com educação, porém não menos indignados. E não têm vontade de perdoar àqueles que lhes deram um mau teatro infantil”.
A trilha sonora não dialoga com a cena. Funciona meramente como música-ambiente
De fato não se engana o público, muito menos o infantil. O mau teatro causa um desserviço à formação da criança. Ao final da sessão, o comentário de uma mãe: “Se nós, adultos, ficamos decepcionados e revoltados, imagine as crianças… Nem de graça”.