Matéria publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Eliana Yunes – Rio de Janeiro – 23.08.1986
Crianças – Um Lugar ao Sol na Bienal
Desde 1978 a Bienal do Livro tem feito um esforço especial para atrair o público jovem. Este ano, abrindo suas portas pela manhã, a Bienal, em São Paulo, articulou-se com as secretarias de Educação para organizar caravanas de estudantes ao mundo do livro, habitualmente tão desestimuladas pelo tratamento anacrônico que a leitura tem na escola. Longe de atestar a erudição de uns poucos, a leitura é hoje indispensavelmente um instrumento de participação social, já que o poder passa necessariamente pela informação e os noticiários não dão conta do mundo.
Por isto, o quadro de lançamentos na área dos infanto-juvenis é bastante expressivo: entre edições e reedições, cerca de 300 títulos estão ao alcance das mãos pequeninas e autores consagrados se preparam para enfrentar seu fã-clube: Sylvia Orthoff lança várias obras (Deu a Louca na Ervelina, A Mesa de Botequim e Seu Amigo Joaquim), Ziraldo e Rachel de Queiróz assinam juntos (Cafute e Pena de Prata), Bartolomeu Campos Queiroz exibe seu rigor poético em Raul-Luar (e foi o vencedor no concurso da CBL na categoria juvenil com seu Cavaleiro das Sete Luas); Ruth Rocha com Pra Que Serve? e há os mais novos como Flávio de Souza (Uma Menina e Um Menino, Papel de Carta, Papel de Embrulho), Marisa Morkazel (Caracol tirou Casaco, Serpente Aproveitou), Ronald Claver ( A Última Sessão de Cinema), ambos premiados na Bienal Nestlé de Literatura, além de coleções novas como as das Edições Criar, da FTD, da José Olympio e da Nova Fronteira. E mesmo sem comparecer a quaisquer das listagens de livros mais vendidos, a ficção infantil ocupa um lugar ao sol na venda das editoras que, a partir doa anos 70, começaram a criar linhas editoriais equivocamente designadas como paradidáticas.
De todo modo, há um interesse maior pela criança quando se vê que um dos recordes de venda do último trimestre é um livro de Janusz Korczack, Quando Eu Voltar a Ser Criança, da coleção que Fanny Abramovitch dirige para a Summus Editorial.
No momento em que se debate a questão da alfabetização, em que há – oficialmente – mais de sete milhões de crianças fora da escola e o que o perfil do aluno da escola noturna indica é uma acentuada marca ascendente na faixa de adolescentes, há que se repensar urgentemente os caminhos que levam ao domínio da língua materna , o que não se resolve com as mudanças ortográficas. A leitura literária, desde os mais tenros anos, é uma das chaves mais surpreendentes para o domínio da escrita. E a produção de livros para este público já tem uma qualidade digna e expressivos números de produção.
A crise do livro no país é inegavelmente, hoje, uma crise de distribuição, a começar pelas bibliotecas públicas, onde são raras as sessões infantis e a orientação para a leitura inexiste. Enquanto isto, a Nova Republica se debate no grande dilema de saber se o livro e a leitura são um problema da Educação ou da Cultura. Sem bibliotecas atuantes e atualizadas, dinâmicas e bem informadas, não adiantam escolas técnicas, agrícolas ou Cieps. E apesar do descaso e dos entraves a um fator vital nas transformações sociais, é com este público infanto-juvenil que começam a se modificar os hábitos de leitura no país. Que o diga a Bienal, que vem patrocinando paralelamente à Feira o Seminário Latino-Americano de Literatura Infantil, que este ano conta com especialistas de sete países, oferece grupos de estudos temáticos e cursos sobre autores e obras premiadas. E como não é Copa do Mundo, não há transmissão ao vivo…